novembro 02, 2009

Jesusalém - Mia Couto

"Jesusalém é seguramente a mais madura e mais conseguida obra de um escritor no auge das suas capacidades criativas. Aliando uma narrativa a um tempo complexa e aliciante ao seu estilo poético tão pessoal, Mia Couto confirma o lugar cimeiro de que goza nas literaturas de língua portuguesa. A vida é demasiado preciosa para ser esbanjada num mundo desencantado, diz um dos protagonistas deste romance. A prosa mágica do escritor moçambicano ajuda, certamente, a reencantar este mundo"

Gosto muito dos livros do Mia Couto, porque estão cheios de fantasia, parecem fábulas dos tempos modernos, mas com personagens muito reais. Jesusalém não foge a isso, embora ache o livro um pouco mais terra a terra do que os outros que li dele, o que não é necessariamente mau, apenas diferente. Já o Venenos de Deus, Remédios do Diabo, me pareceu diferente nesse sentido.

Jesusalém fala-nos de um pai, Silvestre Vitalício, de dois filhos, Ntunzi e Mwanito (o narrador da história) e de Zacaria Kalash, o militar. Embora existam outras personagens importantes na história, estas constituem o núcleo central da narrativa.
O livro começa com Mwanito a dizer que "A primeira vez que vi uma mulher tinha onze anos e me surpreendi subitamente tão desarmado que desabei em lágrimas", o que nos prende logo desde o início. O pai de Mwanito, Silvestre Vitalício, depois da morte da mulher, Dordalma, pegou nos filhos e no fiel amigo Zacaria Kalash e instalou-se num pedaço de terra, a que chamou de Jesusalém, longe de tudo e de todos. Para ele "o mundo terminara e nós éramos os últimos sobreviventes", tal foi o desgosto de perder a mulher.
Mwanito, o filho mais novo não se lembra de nada do "Lado de lá", para ele o mundo resume-se ao homens que com ele vivem em Jesusalém, e ao Tio Aproximado que lhes leva o necessário para sobreviverem. O irmão mais velho, Ntunzi, pelo contrário, tem memórias claras de como era a vida antes e sente-se, por isso, preso e frustrado.

É uma história bonita, cheia de sentimentos contraditórios, porque embora Mwanito se sinta roubado, por o pai o ter afastado do mundo, tem por ele muito respeito e amor. E quando este mais precisa dele não o abandona porque, por mais mágoas que existam, pai é pai.
É também uma história que fala de culpa e do que somos capazes de fazer para expiar essa culpa, de maneira a podermos seguir em frente.

É sempre complicado descrever e classificar os romances do Mia Couto mas, Jesusalém é a história de um homem ferido e envergonhado de tal forma que se isola do mundo levando com ele aquilo que lhe resta. Um homem que, de tão infeliz, impede a felicidade dos filhos protegendo-os das crueldades da vida e do mundo. Qualquer pai gostaria de o poder fazer, afastar os filhos das brigas, dos desgostos, da infelicidade mas, é virtualmente impossível, porque sem esses dissabores eles nunca aprenderão a ser felizes.

Tudo isto é contado ao estilo de Mia Couto, com alguma loucura à mistura. Eu gostei muito! :)

5 comentários:

  1. Acho que captou muito bem a essência deste livro, de que gostei bastante. Acrescento apenas uma coisa: a forma bela como Mia Couto brinca com as palavras; um exemplo disso é o próprio título da obra.

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  2. Fico contente que tenha gostado da minha opinião. Quando a publiquei fiquei com a sensação que não passei bem a mensagem de que o Mia Couto é de facto um escritor extraordinário. Além de que é muito difícil descrever os livros dele, porque não são, de facto livros normais. Sinto que para os comentar com justiça teria eu própria de ser um Mia Couto e "brincar com as palavras" como ele. Não tenho essa capacidade, por isso sou apenas leitora e não escritora. :)

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  3. adorei o livro, apesar de ser um pouco dificil.

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  4. Mia couto é sempre cheio de supresas...

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