novembro 17, 2018

[Kindle] Vermelho da Cor do Sangue (Não Matarás vol. II) - Pedro Garcia Rosado

Título original: Vermelho da Cor do Sangue - Não Matarás vol.II
Ano da edição original: 2010
Autor: Pedro Garcia Rosado
Editora:Edições ASA

"Quando um mercenário ucraniano conhecido por Gengis Khan assalta a casa do banqueiro Ramiro de Sá, além de um segurança morto e das jóias roubadas, deixa atrás de si um problema inesperado: do cofre do banqueiro foi também levado o passaporte de Valentim Zadenko, um emissário do partido comunista da União Soviética que entrou em Lisboa no dia 24 de Novembro de 1975 e aí desapareceu misteriosamente. Enquanto o inspector Joel Franco, da Polícia Judiciária, investiga o homicídio do vigilante, o passaporte torna-se uma relíquia que muitos querem deitar a mão: não só o próprio Ramiro de Sá, mas também o chefe da máfia russa, um inspector do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, um veterano do PCUS que foi camarada de Zadenko e ainda Svetlana, a filha do operacional desaparecido, que vem para Lisboa à sua procura, alertada por um angolano que estudou em Moscovo e participou no assalto. Na busca do documento, todos os caminhos acabarão, mais tarde ou mais cedo, por ir dar a Ulianov, um ex-KGB especialmente treinado que em Portugal se tornou dirigente de um grupo criminoso. Joel terá de contar com a sua ajuda para desenterrar uma conspiração criminosa que nasceu no PREC e envolveu militares revolucionários, banqueiros, assassinos … e várias garrafas de Barca Velha.
«Não Matarás» é uma série de thrillers ambientados em Portugal e com personagens portuguesas. O seu protagonista é Joel Franco, inspector na Secção de Homicídios da Polícia Judiciária que, em todos os crimes que resolve, sabe estar a vingar uma morte a que assistiu na infância."

Neste segundo volume de Não Matarás, o agente Joel Franco vê-se envolvido num caso com raízes nos tempos tumultuosos do pós 25 de Abril, com as várias facções políticas a extremarem posições. De um lado os simpatizantes (por vezes mais do que simpatizantes) do regime deposto e do outro os grupos de esquerda que começam a despertar o interesse internacional do regime comunista da URSS.
Um veterano do PCUS (Partido Comunista da União Soviética), entra em Portugal em 1975, e desaparece sem deixar rasto, deixando uma filha na Rússia. A casa de um banqueiro influente é assaltada e, entre outras coisas, um passaporte é roubado. No decorrer do assalto, o segurança do banqueiro é morto e Joel Franco é chamado para investigar.
Aquilo que, à primeira vista, era apenas um segurança a ser uma vítima fortuita de um vulgar assalto à propriedade de um homem rico, acaba por ser tornar em algo mais do que estar no sítio errado à hora errada. Joel vai mergulhar no submundo da máfia russa a operar em Portugal e vai contar com a ajuda de um ex-agente da KGB, afastado da vida de crime, e a viver em Portugal, que devido ao seu passado de ligação à máfia russa, acaba por ser arrastado para o meio disto tudo.

Vermelho Cor de Sangue é o segundo volume da série Não Matarás, do escritor português Pedro Garcia Rosado. Já tinha gostado bastante do primeiro volume, A Cidade do Medo (opinião aqui), e este Vermelho Cor de Sangue veio consolidar a minha boa opinião.
Tenho problemas com policiais, não é um género para o qual esteja sempre disponível, no entanto gosto de descobrir novos escritores e de vez em quando tenho necessidade de enveredar por um bom espécime do género. Pedro Garcia Rosado agrada-me e, ainda por cima é português e, acho que ler autores portugueses que colocam as suas histórias no nosso universo é, para mim enquanto leitora, muito recompensador.

Recomendo sem quaisquer reservas.

Boas leituras!

Excerto:
"O contributo do grande povo da União Soviética dará à nossa revolução um alento que incendiará as ruas do País e levará à vitória os nossos operários, os nossos camponeses e os nossos soldados!"

Número Zero - Umberto Eco

Título original: Numero Zero
Ano da edição original: 2015
Autor: Umberto Eco
Tradução: Jorge Vaz de Carvalho
Editora: Gradiva

"A redacção de um diário reunida à pressa prepara um jornal dirigido, mais do que à informação, à chantagem, à intriga, ao lodo e às reportagens ignóbeis, que a chefia exige para aumentar as vendas.
Um redactor paranóico que, circulando por uma Milão alucinada (ou alucinado por uma Milão normal), reconstrói uma história com cinquenta anos, tendo como pano de fundo um plano diabólico arquitectado em torno do cadáver putrefacto de um pseudo-Mussolini. E, na sombra, o Gladio, a P2, o assassino do Papa Luciani, a CIA, os terroristas vermelhos manobrados pelos serviços secretos, vinte anos de massacres e de pistas falsas, um conjunto de factos inexplicáveis que parecem inventados, até que uma transmissão da BBC vem provar que são verdadeiros ou, pelo menos, são agora confessados como tal pelos seus autores. Depois, um cadáver entra subitamente em cena na mais estreita e mal-afamada rua de Milão. E ainda uma frágil história de amor entre dois protagonistas perdedores por natureza: um ghost writer falhado e uma rapariga inquietante que, para ajudar a família, abandona a universidade e se especializa em gossip sobre amizades afectuosas, mas é ainda capaz de chorar no segundo andamento da 7ª de Beethoven. Uma história que se desenrola e, 1992, em que se prefiguram muitos dos mistérios e loucuras dos vinte anos seguintes, precisamente quando os dois protagonistas pensam que o pesadelo terminara. Um caso amargo e grotesco que se desenrola ma Europa desde o fim da Segunda Guerra até aos nossos dias.
Este é o manual perfeito para o mau jornalismo que, gradualmente, nos impossibilita de distinguir uma invenção de um directo.
Um livro que se lê avidamente, de um grande autor que surpreende sempre!"


Número Zero conta a história da criação de um jornal diário, fictício, cujo único objetivo é a chantagear e provocar desconforto em alguns grupos da sociedade italiana. 
Nunca se pretendeu publicar o que quer que seja, no entanto, para além do diretor do jornal, Simei, e de Colonna, um escritor falhado, mais ninguém sabe que Número Zero nunca chegará às bancas dos jornais. Por isso, para todas aquelas pessoas contratadas para participarem na criação deste novo jornal, tudo aquilo é real e o comportamento que observamos é, para todos os efeitos real, independentemente de o jornal nunca vir a ser publicado.

Colonna é um cinquentão, um escritor fantasma que nunca conseguiu escrever nada sem ser em nome de outra pessoa. É contratado por Simei para acompanhar de perto a invenção do Número Zero e no fim escrever um livro sobre o esquema montado, onde seria revelada toda a verdade, a troco de muito dinheiro. O que o leva a participar é apenas e só a necessidade financeira, Colonna é um homem honesto, um pouco desiludido com o rumo que a sua vida parece ter levado. 
Na redação deste jornal inventado conhece Maia Fresia, uma jovem jornalista de revistas cor-de-rosa, que viu neste projecto uma oportunidade para fugir às amizades coloridas dos famosos e crescer como profissional. Os dois, acabam por se aproximar, ele atraído pela sua juventude e aparente fragilidade, ela pela segurança e tranquilidade que ele lhe traz.

Número Zero leva-nos pelos meandros da imprensa, pelo que de pior pode ser e, leva-nos a reflectir sobre a importância da sua existência, como órgão isento e honesto.
Umberto Eco expõe a facilidade com que se manipula a opinião pública com as tão faladas fake news que nos deixam a todos, menos informados e mais desprotegidos. A descredibilização dos órgãos de comunicação social é, talvez um dos maiores perigos que a democracia enfrenta nos dias de hoje. Temos cada vez mais dificuldade em distinguir a verdade da mentira e estamos, como sociedade, menos sensíveis à mentira. Tendemos a desvalorizar estes comportamentos e, quem os pratica sente-se validado e deixa de ser sentir errado e julgado. Passa a ser uma forma de estar tolerada por todos. Somos mais individualistas e se, como individuo, não consigo percepcionar e efectivamente perceber as consequências da corrupção, não me sinto suficientemente interessado para exigir justiça.
 
É um livro pequeno, que se lê muito bem. Aborda o tema quase como uma paródia, como se não se levasse muito a sério, no entanto a mensagem é bastante clara.
 
Não sendo novidade que tenho um carinho especial pelo Umberto Eco, este Número Zero foi uma versão mais levezinha do que costumam ser os livros dele, em termos de bagagem cultural e, foi uma excelente companhia nas férias de verão.
 
 
 
Recomendo sem qualquer hesitação.
 
Boas leituras!
 
Excerto (pág.162)
"Amor, não estás a considerar que, pouco a pouco, também a Itália se está a tornar como os países de sonho para onde te queres exilar. Se somos capazes, em primeiro lugar, de aceitar e, em seguida, de esquecer todas as coisas que nos contou a BBC, isto significa que estamos a habituar-nos a perder a vergonha. Não viste como todos os entrevistados desta noite contavam tranquilamente que tinham feito isto ou aquilo, e que estavam quase à espera de uma medalha? Não mais claros-escuros do barroco, coisas de Contra-Reforma - os tráficos emergirão en plein air, como se os impressionistas os pintassem: a corrupção autorizada, o mafioso oficialmente no parlamento, o evasor fiscal no governo, e na prisão só os pilha-galinhas albaneses. As pessoas de bem continuarão a votar nos patifes, porque não acreditarão na BBC, ou não quererão ver programas como os desta noite, porque terão aderido a qualquer coisa mais trash, provavelmente as televendas de Vimercate acabarão no horário nobre, será morto alguém importante, funerais de Estado."