janeiro 15, 2022

A Noite Em que o Verão Acabou - João Tordo

Título: A Noite em que o Verão Acabou
Ano da edição original: 2019
Autor: João Tordo
Editora: Companhia das Letras

"14 de Setembro de 1998. O dia em que Chatlam, uma pequena vila americana, acordou em choque com o homicídio de Noah Walsh. O principal suspeito: a sua filha de dezasseis anos.

No Verão de 1987, o adolescente Pedro Taborda apaixona-se por Laura Walsh, a filha mais velha de um magnata nova-iorquino. Ela e Levi - uma criança misteriosa - passam férias com os pais no Lagoeiro, uma pacata cidade algarvia. Rica e moderna, a família Walsh tem tudo para dar muito nas vistas no sul de Portugal. Inebriado pelas formas perfeitas e pelos modos ousados de Laura, Pedro encontra na rapariga americana o seu primeiro amor. Mas quando o Verão acaba, a família Walsh regressa aos Estados Unidos e o destino fica por cumprir.
Dez anos depois, Pedro, decidido a tornar-se escritor, vai estudar para Nova-Iorque. Fascinado com Gary List, antigo prodígio das letras americanas, chega aos Estados Unidos determinado a perseguir os sonhos da juventude. Ao reencontrar Laura, está longe de suspeitar que esse acaso o mergulhará no crime mais falado dos anos noventa, o homicídio do milionário Noah Walsh.
Com um segundo homicídio a atrapalhar a investigação e uma corrida para salvar Levi, de apenas dezasseis anos, acusada de matar o pai, Pedro e Laura enredam-se irremediavelmente na teia de segredos que envolve a família Walsh, desde os anos quarenta do século XX até ao impensável desfecho nas primeiras décadas do novo milénio.

Porque em Chatlam - e neste thriller imparável - nada é o que parece."

A sinopse é clara quanto à história. Pedro Taborda, em 1987, é um adolescente a passar férias no Algarve com a família. Laura é uma adolescente americana que também está de férias no Algarve.
As duas famílias acabam por criar laços durante aqueles dias intermináveis de verão e a entrada de Laura na vida de Pedro vai marcá-lo para a vida, não só porque o primeiro amor é algo que dificilmente se esquece, mas também porque os Walsh são exuberantes e pouco convencionais.
Após as férias de verão, os dois mantém contacto durante algum tempo, até que a vida acaba por espaçar as cartas que, um dia, findam de vez. 

Anos mais tarde, Pedro vai estudar para os Estados Unidos e reencontra Laura. Pouco tempo depois do reencontro, o pai de Laura é encontrado morto em casa e tudo indica que terá sido assassinado pela irmã mais nova de Laura, a estranha Levi. Laura não acredita que a irmã seja culpada e enquanto decorrem as investigações oficiais, Laura "arrasta" Pedro numa corrida contra o tempo para encontrar o verdadeiro culpado e provar a inocência de Levi.
Como seria de esperar, a investigação desenterra histórias do pai, algumas antigas, outras mais recentes. Nenhuma delas muito abonatória para o pai.

Basicamente, em termos de fio condutor do livro, é isto - a relação de Pedro com Laura, a investigação que iniciam os dois e que nos leva a conhecer melhor a história dos Walsh e, por fim, o desvendar do mistério que envolve a morte de Noah Walsh.

Pessoalmente não acho que seja este o género em que João Tordo mais brilhe, embora a forma como ele aborda o género também não seja a mais convencional.
O mistério dos assassinatos até está bem conseguido e a forma como se vão desvendando as coisas é interessante. É engraçado não ser uma investigação policial típica, tem uma velocidade diferente e o foco acaba, até por ser outro. O livro é muito mais do que uma investigação desenfreada ou uma corrida contra o tempo. Talvez por isso tenha alguma dificuldade em classificá-lo como policial e menos ainda como um thriller. O que não é uma coisa má, apenas pode ser enganadora para quem vai ler o livro.

Achei que o livro poderia ser bem mais pequeno. Dispensava, a maioria das páginas dedicadas à vida de Pedro. Não sinto que tenham acrescentado alguma coisa à história e eram, muitas vezes, completamente irrelevantes para a mesma. Sou sincera, não achei o Pedro uma personagem muito interessante e tudo o que o envolvia apenas a ele era só aborrecido... Desculpa João Tordo. :)

Não amei mas também não detestei. Só não me vai ficar na memória por muito tempo. 

A minha opinião sobre o talento de João Tordo, não ficou, em nada, beslicada. Acho até saudável ele não ter problemas em experimentar novas abordagens e, no fundo, escrever o que lhe apetece, sem se sentir na obrigação de seguir uma cartilha. 

Recomendo, porque dentro do género é um livro que pode ser interessante. 

Se nunca leram João Tordo, não comecem por este ou outros do género. O primeiro que li dele foi o As Três Vidas (opinião aqui) e fiquei fã.  No entanto, de todos os que já li dele, aqueles que mais me dizem são os da "Trilogia dos lugares sem nome" - O Luto de Elias Gro (opinião aqui); O Paraíso Segundo Lars D. (opinião aqui) e O Deslumbre de Cecília Fuss, que ainda não li. Têm muito por onde escolher. :)

Boas leituras!


Excerto (pág.14):

"Na tarde em que comecei a chorar, a cadela trazia a boneca na boca, mordendo-a com a força dos seus caninos de bicho ainda jovem.
Chorei todas as noites durante uma semana, a boneca caída no relvado da casa de férias dos meus pais. Tornou-se o brinquedo de Niki até o meu pai a guardar na garagem. Era a única memória física que me restava de Laura e de Levi, que regressaram aos Estados Unidos no final de Agosto; uma coisa velha feita de trapos, com dois botões a servirem de olhos, cabelo ruivo e uma boca infeliz. A seguir - porque aos treze anos recuperamos com facilidade dos choques emocionais - , distraí-me com o ténis, a exploração do terreno dos lagartos e as parvoíces da minha irmã e esqueci-me temporariamente da ausência das raparigas americanos no Lagoeiro.
No anos seguinte, Laura e Levi não voltaram como prometido (...)"

janeiro 03, 2022

A História de uma Gaivota e do Gato que a Ensinou a Voar - Luís Sepúlveda

Título original: 
Historia de una Gaviota Y del Gato que le Enseño a Volar
Ano da edição original: 1996
Autor: Luís Sepúlveda
Traduzido do espanhol (Chile): Pedro Tamen
Editora: Edições ASA

"Esta é a história de Zorbas, um gato grande, preto e gordo. Um dia, uma formosa gaivota apanhada por uma maré negra de petróleo deixa ao cuidado dele, momentos antes de morrer, o ovo que acabara de pôr.

Zorbas, que é um gato de palavra, cumprirá as duas promessas que nesse momento dramático lhe é obrigado a fazer: não só criará a pequena gaivota, como também a ensinará a voar. Tudo isto com a ajuda dos seus amigos Secretário, Sabetudo, Barlavento e Colonello, dado que, como se verá, a tarefa não é fácil, sobretudo para um bando de gatos mais habituados a fazer frente à vida dura de um porto como o de Hamburgo do que a fazer de pais de uma cria de gaivota…

Com a graça de uma fábula e a força de uma parábola, Luis Sepúlveda oferece-nos neste seu livro já clássico uma mensagem de esperança de altíssimo valor literário e poético."

Uma bonita história de amizades improváveis e de aceitação do que não conhecemos ou que é diferente de nós. 

Uma história de compromissos e promessas, onde a palavra tem valor.

A bonita utopia de que não existem impossíveis quando todos remamos para o mesmo lado. 

Uma triste história de atentados ambientais que, eram já uma preocupação de Sepúlveda, nos anos 90.

Foi muito bom voltar a ele com um clássico que ainda não tinha tido a oportunidade de ler.

Esta edição, mais antiga, comprei-a na Livraria Solidária de Carnide, um espaço muito giro e acolhedor. Fui lá para entregar alguns livros que já não faziam muito sentido nas minhas estantes. O objetivo era ganhar algum espaço nas estantes, mas saí de lá com mais alguns debaixo do braço. Não me lembro se o saldo foi positivo para as estantes, mas para mim foi de certeza! ;) 
Se tiverem oportunidade de passar por lá não deixem de o fazer. Vale muito a pena.

Excerto (pág.29):

"O gato grande, preto e gordo estava a apanhar sol na varanda, ronronando e meditando acerca de como se estava bem ali, recebendo os cálidos raios pela barriga acima, com as quatro patas muito encolhidas e o rabo estendido.
No preciso momento em que rodava preguiçosamente o corpo para que o sol lhe aquecesse o lombo ouviu o zumbido provocado por um objecto voador que não foi capaz de identificar e que se aproximava a grande velocidade. Atento, deu um salto, pôs-se de pé nas quatro patas e mal conseguiu atirar-se para um lado para se esquivar à gaivota que caiu na varanda.
Era uma ave muito suja. Tinha o corpo impregnado de uma substância escura e malcheirosa. (...)
 - Vou pôr um ovo. Com as últimas forças que me restam vou pôr um ovo. Amigo gato, vê-se que és um animal bom e de nobres sentimentos. Por isso, vou pedir-te que me faças três promessas-~. Fazes? - grasnou ela, sacudindo desajeitadamente as patas numa tentativa falhada de se pôr de pé.
Zorbas pensou que a pobre gaivota estava a delirar e que com um pássaro em estado tão lastimoso nunguém podia deixar de ser generoso.
 - Prometo-te o que quiseres. Mas agora descansa - miou ele compassivo.
 - Não tenho tempo para descansar. Promete-me que não comes o ovo - grasnou ela abrindo os olhos.
 - Prometo que não te como o ovo - repetiu Zorbas.
 - Promete-me que cuidas dele até que nasça a gaivotinha.
 - Prometo que cuido do ovo até nascer a gaivotinha.
 - E promete-me que a ensinas a voar - grasnou ela fitando o gato nos olhos.
Então Zorbas achou que aquela infeliz gaivota não só estava a delirar, como estava completamente louca.
 - Prometo ensiná-la a voar. E agora descansa, que vou em busca de auxílio - miou Zorbas trepando de um salto para o telhado.
Kengah olhou para o céu, agradeceu a todos os bons ventos que a haviam acompanhado, e justamente ao exalar o último suspiro, um ovito branco com pintinhas azuis rolou junto do seu corpo impregnado de petróleo."

[Kindle] Pátria - Fernando Aramburu

Título original: 
Patria
Ano da edição original: 2016
Autor: Fernando Aramburu
Tradução: Cristina Rodriguez e Artur Guerra
Editora: Publicações Dom Quixote

"O retábulo definitivo sobre mais de 30 anos da vida no País Basco sob o terrorismo.

No dia em que a ETA anuncia o abandono das armas, Bittori dirige-se ao cemitério para, na sepultura do marido, Txato, assassinado pelos terroristas, lhe contar que decidira voltar à casa onde tinham vivido os dois. Mas poderá ela conviver com aqueles que a perseguiram antes e depois do atentado que transtornou a sua vida e a da família? Poderá saber quem foi o encapuzado que num dia chuvoso matou o marido, quando este regressava da sua empresa de transportes?
Por mais que chegue às escondidas, a presença de Bittori alterará a falsa tranquilidade da terra, sobretudo a da vizinha Miren, amiga íntima noutros tempos, e mãe de Joxe Mari, um terrorista encarcerado e suspeito dos piores receios de Bittori. O que aconteceu entre essas duas mulheres? O que envenenou a vida dos filhos e dos respetivos maridos, tão unidos no passado? Com lágrimas escondidas e convicções inabaláveis, com feridas e coragem, a história arrebatadora das suas vidas, antes e depois da tormenta que foi a morte de Txato, fala-nos da impossibilidade de esquecer e da necessidade de perdoar numa comunidade fragmentada pelo fanatismo político."

Pátria leva-nos numa viagem atribulada ao mundo da ETA e da luta armada no País Basco, através do olhar de duas mulheres, Miren e Bittori. 
Miren é mãe de Joxe Mari, um rapaz que foi recrutado pela ETA e um  membro convicto da organização, que acaba a cumprir pena de prisão por atentados terroristas. 
Bittori é a viúva de Txato, uma das muitas vítimas da ETA, assassinado à porta de casa.

Antes da ETA, Miren e Bittori eram amigas e as famílias muito próximas. Depois, tudo se extremou, ou se está com a ETA e portanto a favor de um País Basco independente de Espanha ou se está contra a ETA e, dessa forma a favor de uma Espanha unificada. Não existe espaço para zonas cinzentas, não existe tolerância para se ser a favor da independência e simultaneamente contra a forma de luta levada a cabo pela ETA.

É um livro muito interessante, sobre a luta basca pela independência, sobre as pessoas que fazem parte dessa luta e das consequências que isso traz para a vida de cada uma delas.
Tenho alguma dificuldade em perceber fanatismos e o amor irracional a causas. Não percebo os mecanismos, não conheço ninguém assim e sinto quase sempre que é um problema mental, de distorção da realidade, ou de solidão e da procura desesperada por sentir que se pertence a algo, que não estamos sozinhos e fomos aceites pela comunidade.

Gosto de descobrir novos escritores e tenho gostado muito dos espanhóis. Fernando Aramburu não foi exceção.
Gostei da escrita e da forma como Aramburu nos conta a história. Confesso que o achei, por vezes,  repetitivo e dei por mim, algumas (poucas) vezes, a pensar que "já acabavas o livro, não vale a pena continuarmos a bater no ceguinho". A verdade é que vamos revivendo todos os acontecimentos de acordo com a perspetiva de cada um dos intervenientes e por vezes não existem assim tantas diferenças e o ritmo da história acaba por ser afetado.

Recomendo sem hesitações. É um livro muito interessante e bem escrito.

Boas leituras!

Excerto:
"Eu com pena do filho da minha melhor amiga, que tinha deixado o trabalho, a equipa de andebol e a namorada ou a meio namorada, para entrar como pistoleiro numa organização que se dedica ao assassínio em série.
E Miren? Olha, Ikatza, agora que me perguntas, vou dizer-te o que penso. No fundo, e que o Txato me perdoe, compreendo-a. Compreendo a sua transformação, embora não a aprove. Entre aquele lanche no café da Avenida e o seguinte na churrería da Parte Velha, a minha amiga Miren mudou. De repente era outra pessoa. Numa palavra, tinha tomado partido pelo seu filho. Não tenho a  menor dúvida que ficou fanática por instinto materno. No lugar dela, talvez eu me tivesse comportado de igual modo. Como é que se pode virar as costas ao nosso próprio filho ainda que saibamos que está a cometer maldades? Até então, Miren não se tinha interessado nem um pouco pela política"

Existe uma mini-série, da HBO, Patria:

janeiro 02, 2022

A Espuma dos Dias - Boris Vian

Título original: L'Écume des Jours
Ano da edição original: 1946
Autor: Boris Vian
Tradução: Aníbal Fernandes
Editora: Relógio d'Água

"«Chamaram-lhe, alguns, a obra-prima do autor. E num prefácio que andou durante muito tempo colado ao seu Arranca-Corações, Raymond Queneau não hesitava perante um rótulo hierarquizante e audacioso: "o mais pungente dos romances de amor contemporâneos". Nos anos sessenta, A Espuma dos Dias circulou com estas difíceis responsabilidades.
Enfrentou-as mostrando a singularidade de um universo ainda não conhecido com tanto talento na literatura; que se comprazia a impor aos homens e aos objectos leis novas, interdependentes. De facto, os objectos que lá existiam tinham um comportamento emotivo e implacavelmente ligado aos estados de alma de quem os utilizava. O que já antes parecia sugerido por Edgar Allan Poe em A Queda da Casa Usher assumia ali uma evidência despudorada que corria em dois sentidos, de sol e sombra, e nos informava muito mais sobre o interior das personagens do que qualquer alusão directa que o texto chegasse a fazer.»" [Da Apresentação de Aníbal Fernandes]

Não sei muito bem o que li, quem são as personagens e em que universo se movimentam. 
Confesso que, durante uma parte da história, estive quase certa de que eram gatos. 😀

Apesar da estranheza, e apesar de não ter achado uma leitura fácil (questionei-me muitas vezes porque é que o estava a ler), a verdade é que gostei.

Colin é um jovem homem, muito rico e que vive sozinho numa grande casa.
Tem por companhia Nicolas, um cozinheiro excêntrico e um amigo, Chick, que anda sempre sem dinheiro porque gasta tudo em tudo o que existe feito pelo Jean-Sol Partre.

Um dia Colin conhece Chloé, apaixonam-se e casam-se.
Chick, por seu lado, mantém uma relação desequilibrada com Alise, a bonita sobrinha do excêntrico cozinheiro.

E tudo corre bem, até ao dia em que Chloé desenvolve uma doença estranha, nos pulmões, que lhe provoca dores e dificuldades em respirar. 
A única coisa que a alivia é estar rodeada de flores e por isso Colin gasta tudo o que tem em manter a mulher rodeada de flores.
Não é assim tão fácil arranjar a quantidade de flores de que Chloé precisa e, por muito que Colin se esforce, ela acaba por ir definhando lentamente. 
À medida que Chloé definha, o dinheiro de Colin vai desaparecendo, e a bonita mansão onde vivem vai encolhendo. A casa vai ficando, literalmente mais pequena.

Há qualquer coisa de mágico neste livro e na forma como está escrito. Como disse no início, não sei muito bem o que li, mas a verdade é que gostei da estranheza e do tom meio irónico de toda a história. Não sei se todos os livros de Boris Vian são assim, mas fiquei curiosa e vou querer ler mais livros dele. 

Recomendo, mesmo que não seja uma leitura fácil, mal não vai fazer. 

Boas leituras! 

Excerto (pág.23):

"- Este pâté de enguias é notável - disse Chick. - Quem te deu a ideia de o fazeres?
- Foi o Nicolas quem teve a ideia - disse Colin - Há (ou antes, havia) uma enguia que aparecia todos os dias, saída do cano da água fria, no seu lavatório.
- É curioso - disse Chick. - E porque é que isso acontecia?
- Punha a cabeça de fora e, fazendo pressão com os dentes, esvaziava o tubo de pasta dentífrica. Como Nicolas só usa pasta americana, de ananás, isso deve tê-la tentado.
- Como é que ele conseguiu apanhá-la? - perguntou Chick.
- Pôs um ananás inteiro no lugar do tubo. Quando ela engolia a pasta, conseguia deglutir e recolher depois a cabeça; mas com o ananás não conseguiu o mesmo resultado e, quanto mais ela puxava, mais os dentes de enterravam no ananás. O Nicolas...
Colin deteve-se.
- O Nicolas o quê? - perguntou Chick.
- Não sei se deva dizê-lo, talvez vá tirar-te o apetite.
- Continua - disse Chick -, já não tenho quase nenhum.
- Nesse momento o Nicolas apareceu e seccionou-lhe a cabeça com uma lâmina de barbear. Depois, abriu a torneira e o resto saiu.
- É tudo? - disse Chick. - Dá-me mais pâté. Espero que haja uma família numerosa dentro do cano.
- Agora o Nicolas pôs lá pasta de framboesa, para ver... - explicou Colin. - Mas diz-me uma coisa: essa tal Alise, de quem falavas..."


Existe, pelo menos uma adaptação para o cinema - L'Écume des Jours (Mood Indigo em inglês), que pelo trailer me parece bem divertido e uma boa adaptação:

janeiro 01, 2022

[Kindle] Se Esta Rua Falasse - James Baldwin

Título original: If Beale Street Could Talk
Ano da edição original: 1974
Autor: James Baldwin
Tradução: José Mário Silva
Editora: Penguin Random House - Grupo Editorial Portugal


“Se esta rua falasse, esta seria a história que contaria: Tish, 19 anos, apaixona-se por Fonny, que conhece desde criança. Fazem juras de amor e conjuram sonhos para a vida a dois. Sensual, violento e profundamente comovente, este romance é uma bela canção de blues, de toada doce-amarga, com notas de raiva e ainda assim cheia de esperança. Publicado pela primeira vez em 1974, Se esta rua falasse é o quinto romance de James Baldwin, um dos nomes maiores da literatura americana do século XX e uma das vozes mais influentes do activismo pelos direitos civis.

Um romance manifesto contra a injustiça da justiça e uma história de amor intemporal, é hoje tão pertinente e tão comovente quanto no dia da sua publicação.”

Se Esta Rua Falasse passa-se nos anos 70, nos Estados Unidos e conta a história de Fonny, acusado e condenado, por ter abusado sexualmente de uma mulher, e da luta da sua namorada, Tish, e da família desta para provar a sua inocência. Um pequeno grande pormenor, Fonny e Tish são negros, o que faz toda a diferença nesta história. 

James Baldwin conta-nos a história destes dois, como se conheceram e se apaixonaram e tudo o que os levou a estarem naquela situação desesperada. 

Acho que poderia ser um livro mais longo, acabou por ser tudo contado de uma forma um pouco atabalhoada e acabou sem que existisse grande propósito para toda aquela jornada.

Foi o meu primeiro livro de James Baldwin e não sei o que estava à espera de encontrar, mas achei que me iria sentir mais ligada à história e às personagens e isso não aconteceu. 

Não fiquei fã da escrita, que me pareceu muito simples e que não me conseguiu transmitir grande emoção. Não fiquei fã da forma como a história é contada, sem grande fluidez e onde a passagem do tempo me pareceu pouco coerente.

Tenho pena, porque a história tem muito potencial mas sinto que, apesar da relevância da história e de todo o contexto que a envolve, como obra literária acho que fica muito aquém. Não sei se ele terá livros diferentes, mais bem desenvolvidos, mas não fiquei com muita curiosidade para descobrir a restante obra dele. 

Recomendo? Assumindo que o meu problema com o livro não está relacionado com a edição ou com uma tradução manhosa, se for honesta, de certeza que existem livros muito semelhantes e mais bem conseguidos, por isso tenho alguma dificuldade em recomendar. 

Boas leituras!

Excerto:

O Fonny tinha descoberto algo que era capaz de fazer, que queria fazer, e isso salvou-o da morte que se preparava para colher tantos da nossa geração. Embora a morte assumisse muitas formas, embora as pessoas morressem jovens de maneiras diferentes, a morte propriamente dita era muito simples e a causa igualmente simples: tão simples como uma praga: diziam aos miúdos que não valiam nada e tudo o que viam à sua volta confirmava a ideia. Esforçavam-se, esforçavam-se, mas caíam como moscas, e juntavam-se nos montes e lixo das suas vidas, como moscas. E talvez eu me tenha agarrado ao Fonny, talvez o Fonny me tenha salvado, porque ele era provavelmente o único rapaz meu conhecido que não andava a drogar-se ou a beber vinho a martelo ou a roubar pessoas ou a fazer assaltos à mão armada em lojas – e nunca domava o cabelo: estava sempre em pé.

Existe uma adaptação do livro para o cinema - If Beale Street Could Talk: