fevereiro 17, 2017

Gente Pobre - Fiódor Dostoiévski

Título original: Bédnie Liúdi
Ano da edição original: 1866
Autor: Fiódor Dostoiévski
Tradução do Russo: Nina Guerra e Filipe Guerra
Editora: Editorial Presença

"Gente Pobre marca a estreia de Dostoiévski na literatura, em 1846, e estabelece desde logo os fundamentos para uma abordagem social, psicológica e profundamente corrosiva da compreensão humana. A análise pormenorizada das personagens e suas convicções, enquadradas por um pano de fundo de crítica subtil, ganha em Dostoiévski uma força e um poder imagéticos que extravasam as páginas dos seus livros. Em Gente Pobre, o autor transporta-nos para um dos bairros mais miseráveis de São Petersburgo, onde um funcionário de meia-idade troca correspondência com uma jovem costureira. Demasiado pobres para se casarem, o seu amor passa todo e apenas por cartas mantidas ao longo do tempo, que reflectem a cruel realidade do quotidiano passado num ambiente de extrema precariedade. Uma leitura incontornável para quem sinta curiosidade pelo universo dostoievskiano."

Gosto de escritores russos, e particularmente de Dostoiévski. Gente Pobre é conhecido como sendo a sua primeira obra publicada e, embora seja Dostoievski, não deixa de ser o primeiro livro de um jovem aspirante a escritor. Quero dizer com isto que não é espectacular, é antes uma obra interessante que vale a pena ler.

A história passa-se em São Petersburgo onde a pobreza e a falta de condições é de certa forma escondida, meio envergonhada.
Um homem de meia idade, trabalhador, não ganha o suficiente para alugar um quarto, o que ganha permite-lhe apenas alugar uma cama, na cozinha de um apartamento.
Este homem está apaixonado por uma jovem mulher, órfã que vive com dificuldades. De saúde frágil, vai ganhando algum dinheiro com trabalhos de costura. Os dois moram perto um do outro, mas são raras as vezes em que se encontram. O livro é feito das cartas que trocam, diariamente, entre si. Nas cartas desabafam as suas misérias e as dificuldades que diariamente têm de enfrentar. Ele procura não a preocupar e gasta mais do que tem a satisfazer alguns dos desejos dela. Ela procura descansá-lo e desvalorizar as necessidades por que passa. Esta é uma relação que não é bem vista pelos outros. Um homem mais velho, pobre, a cortejar uma jovem órfã, educada mas pobre. São alvo de chacota e acabam eles próprios por não reconhecer, nem um ao outro, que o que sentem pode ser mais do que carinho e amizade.

Acaba por ser um livro triste. Duas pessoas procuram o apoio uma da outra, não sei se por amor ou por necessidade de sobrevivência, financeira e emocional. Duas pessoas que não têm mais nada no mundo, nem nada por que ansiar, com sonhos tímidos, como se não acreditassem verdadeiramente que as suas vidas poderiam melhorar, como se não tivessem o direito sequer a sonhar. É um livro triste.

Gente Pobre, como já disse, é interessante, e que vale a pena ler, por ser de Dostoiévski e por ser a sua primeira obra.

Boas leituras!

Excerto (pág. 14):
"Eu não estou zangado, meu amorzinho, isto é apenas um desgosto meu ao lembrar-me de tudo aquilo, um desagrado para comigo por lhe ter escrito de forma tão alambicada e estúpida. Hoje também fui para o serviço todo gabarola, de tal maneira o meu coração exultava. Estava, nem mais nem menos, com alma em festa; estava feliz! Lancei-me aos papéis com todo o zelo, mas o que resultou daí? Terminada a tarefa e olhando em volta, vi tudo como dantes: cinzento, escuro. As mesmas manchas de tinta, os mesmos papéis e mesas, eu próprio o mesmo, tudo tal como sempre foi; porquê então cavalgar Pégaso? E porque me aconteceu aquilo? Só porque brilhou o sol e o céu ficou azul... foi por isso? E que fragrâncias desencantei, se no nosso pátio, debaixo das janelas, acontece cada coisa! Só pode significar que foi por estupidez que imaginei tudo aquilo. Acontece às vezes que o homem se perde nos seus próprios sentimentos e se põe a disparatar. Não é mais do que o ardor exagerado e estúpido do coração. Não caminhei para casa, arrastei-me para casa; a cabeça começou a doer-me sem motivo; uma desgraça, como se sabe, nunca vem só. (Talvez fosse o vento que me esfriou as costas.) Feito parvo, ficara alegre com a Primavera e tinha ido para o trabalho com o capote leve. E a menina também se enganou quanto aos meus sentimentos! Percebeu o meu desabafo no sentido errado. Era o afecto paternal que me inspirava, pura e simplesmente, Varvara Alekséevna, porque, na sua orfandade amarga, eu ocupo o lugar de seu pai; (...)"

1 comentário:

  1. Dostoievski é um dos meus escritores favoritos e se não li todos os livros ainda é para não o "esgotar" demasiado rapidamente. Este está na lista.

    Rui Quinta, Rui de Viagem

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