
A Peste é o primeiro livro que leio de Albert Camus, e estou certa não será o último, embora tenha sido um pouco diferente do que estava à espera.
Em A Peste, Orão é uma cidade próspera do litoral argelino, construída de costas voltadas para o mar, cujos habitantes vivem para trabalhar e acumular riqueza, vivendo de rotinas e sem qualquer sobressalto que os faça questionar a vida que levam. Orão é uma cidade moderna onde as relações humanas são relegadas para segundo plano, sobrevivendo no hábito e na tranquilidade das coisas dadas como certas, "Em Orão, como no resto do mundo,por falta de tempo e de reflexão, é-se obrigado a amar sem o saber." Os negócios são demasiado importantes e o divertimento tem dia e hora marcada. Fez-me alguma confusão a descrição de Albert Camus faz dos habitantes de Orão, tão indiferentes e desligados uns dos outros, mesmo durante a epidemia. Enquanto lia pareceu-me tão irreal que semelhante cidade existisse, mas a verdade é que é um retrato bastante fiel do que vivemos nos dias de hoje.
Fiquei ansiosa quando os ratos começaram a subir à cidade para morrer, por ver a falta de reacção da população. Era quase como se pensassem que ao ignorar o problema, ao não enfrentar a realidade, os ratos acabariam por desaparecer sem consequências. Eram algo desagradável, é certo, mas que apenas lhes alterava a rotina tranquila do dia a dia. Quando as pessoas começaram a morrer de forma tão avassaladora e em tão grande quantidade, a negação da epidemia deixou de ser possível e a cidade foi fechada ao exterior, ficando de quarentena por tempo indeterminado. A morte tinha-se instalado em Orão, separando famílias, amantes e amigos. Quando se viram isolados, sem poderem comunicar com o exterior, todos perceberam a importância que essas pessoas tinham nas suas vidas. Casamentos que se mantinham apenas pelo hábito ganharam nova vida e os amantes separados pelas portas da cidade reavivavam o sentimento devido à separação. Com o passar dos meses a dor da separação foi, para muitos a única razão para se manterem sãos, mesmo que para fim já nem os rostos das pessoas amadas conseguissem recordar com clareza.
Alguns viviam obcecados em fugir da cidade. Reencontrarem-se com quem ficou do lado de fora, era o mais importante. Aparentemente o medo de morrer sozinho era bem maior do que o perigo de contagiarem aqueles a quem desejavam voltar a ver e, que tinham por um golpe de sorte escapado à peste. Outros, como Rieux, Rambert, Tarrou e Grand, entregaram aqueles intermináveis meses de isolamento, medo e dor ao combate e à luta contra a epidemia. Relegando para segundo plano as aflições pessoais de cada um, em prol da comunidade. E houve, como sempre, aqueles que vêm em situações destas a oportunidade de lucrar com a miséria, como Cottard. Este livro tem de tudo e para todos os gostos... :)
Enfim, A Peste é um livro que faz um reflexão muito interessante sobre a morte e a vida, sobre as fragilidades humanas e sobre a forma como lidamos uns com os outros, em sociedade. Gostei muito de o ler, embora tenha ficado com a sensação de que a tradução desta edição não é das melhores. Fez-me confusão a forma distante como a história é narrada, numa espécie de crónica, onde os factos são relatados com muita objectividade pelo narrador. As excepções a esta objectividade resultaram, para mim, nos momentos que mais gostei de ler, embora falar de gosto seja provavelmente de mau gosto, pois foram momentos dramáticos. É o caso da morte do filho do juiz, apenas uma criança e a morte de Tarrou, uma pessoa intrinsecamente boa. Gostei muito das personagens que constituem o núcleo desta narrativa, Rambert, Grand, Cottard e, particularmente de Rieux e Tarrou.
Vale muito a pena ler A Peste. :)
Pretensos Factos:
- Dizem os dissecadores de livros que A Peste é uma alegoria à invasão de França pelas tropas alemãs, em 1940, em pleno nazismo. E, provavelmente essa leitura é válida.
- Albert Camus ter-se-à inspirado na epidemia de cólera que dizimou, em 1849, uma elevada percentagem da população de Oran, a segunda maior cidade da Argélia.
Em A Peste, Orão é uma cidade próspera do litoral argelino, construída de costas voltadas para o mar, cujos habitantes vivem para trabalhar e acumular riqueza, vivendo de rotinas e sem qualquer sobressalto que os faça questionar a vida que levam. Orão é uma cidade moderna onde as relações humanas são relegadas para segundo plano, sobrevivendo no hábito e na tranquilidade das coisas dadas como certas, "Em Orão, como no resto do mundo,por falta de tempo e de reflexão, é-se obrigado a amar sem o saber." Os negócios são demasiado importantes e o divertimento tem dia e hora marcada. Fez-me alguma confusão a descrição de Albert Camus faz dos habitantes de Orão, tão indiferentes e desligados uns dos outros, mesmo durante a epidemia. Enquanto lia pareceu-me tão irreal que semelhante cidade existisse, mas a verdade é que é um retrato bastante fiel do que vivemos nos dias de hoje.
Fiquei ansiosa quando os ratos começaram a subir à cidade para morrer, por ver a falta de reacção da população. Era quase como se pensassem que ao ignorar o problema, ao não enfrentar a realidade, os ratos acabariam por desaparecer sem consequências. Eram algo desagradável, é certo, mas que apenas lhes alterava a rotina tranquila do dia a dia. Quando as pessoas começaram a morrer de forma tão avassaladora e em tão grande quantidade, a negação da epidemia deixou de ser possível e a cidade foi fechada ao exterior, ficando de quarentena por tempo indeterminado. A morte tinha-se instalado em Orão, separando famílias, amantes e amigos. Quando se viram isolados, sem poderem comunicar com o exterior, todos perceberam a importância que essas pessoas tinham nas suas vidas. Casamentos que se mantinham apenas pelo hábito ganharam nova vida e os amantes separados pelas portas da cidade reavivavam o sentimento devido à separação. Com o passar dos meses a dor da separação foi, para muitos a única razão para se manterem sãos, mesmo que para fim já nem os rostos das pessoas amadas conseguissem recordar com clareza.
Alguns viviam obcecados em fugir da cidade. Reencontrarem-se com quem ficou do lado de fora, era o mais importante. Aparentemente o medo de morrer sozinho era bem maior do que o perigo de contagiarem aqueles a quem desejavam voltar a ver e, que tinham por um golpe de sorte escapado à peste. Outros, como Rieux, Rambert, Tarrou e Grand, entregaram aqueles intermináveis meses de isolamento, medo e dor ao combate e à luta contra a epidemia. Relegando para segundo plano as aflições pessoais de cada um, em prol da comunidade. E houve, como sempre, aqueles que vêm em situações destas a oportunidade de lucrar com a miséria, como Cottard. Este livro tem de tudo e para todos os gostos... :)
Enfim, A Peste é um livro que faz um reflexão muito interessante sobre a morte e a vida, sobre as fragilidades humanas e sobre a forma como lidamos uns com os outros, em sociedade. Gostei muito de o ler, embora tenha ficado com a sensação de que a tradução desta edição não é das melhores. Fez-me confusão a forma distante como a história é narrada, numa espécie de crónica, onde os factos são relatados com muita objectividade pelo narrador. As excepções a esta objectividade resultaram, para mim, nos momentos que mais gostei de ler, embora falar de gosto seja provavelmente de mau gosto, pois foram momentos dramáticos. É o caso da morte do filho do juiz, apenas uma criança e a morte de Tarrou, uma pessoa intrinsecamente boa. Gostei muito das personagens que constituem o núcleo desta narrativa, Rambert, Grand, Cottard e, particularmente de Rieux e Tarrou.
Vale muito a pena ler A Peste. :)
Pretensos Factos:
- Dizem os dissecadores de livros que A Peste é uma alegoria à invasão de França pelas tropas alemãs, em 1940, em pleno nazismo. E, provavelmente essa leitura é válida.
- Albert Camus ter-se-à inspirado na epidemia de cólera que dizimou, em 1849, uma elevada percentagem da população de Oran, a segunda maior cidade da Argélia.
Eu adoro a escrita de Camus. Este foi também o primeiro que li do autor e depois sempre que passava por uma livraria acabava por trazer um livro dele para casa. :)
ResponderEliminarVim a correr para ver qual seria o próximo :)
ResponderEliminarAgora vou ler o texto.
Já li o texto. Vou procurar o livro, agora também fiquei com vontade de ler este :)
ResponderEliminarTambém gostei muito da escrita. Tinha uma ideia diferente da escrita dele, pensei que fosse complicada e mais pesada, mas não é, lê-se muito bem. O próximo dele será o Estrangeiro. :)
ResponderEliminarPois, desta vez fiquei indecisa sobre o próximo. Os livros que me restam na estante (excepto os das revistas que são compras de oportunidade) são quase todos parte de séries e não queria estar a começar uma maratona de George R. R. Martin e Stieg Larsson. Vou para o Robert Wilson porque não me deve "obrigar" a continuar a leitura dos próximos da série Javier Falcón. :)
Sim este e o "Estrangeiro" são histórias que se lêem muito bem. "A Queda" e "O Avesso e o Direito", já considero um pouco mais, não digo complicados, mas requerem uma outra concentração. Este último é uma conjunto de várias histórias.
ResponderEliminar"A Queda" é uma excelente introspecção a nós mesmos e à espécie humana.
Fazes bem em que o próximo do autor seja "O Estrangeiro". Caso querias ler a minha opinião sobre o livro, aqui fica o link:
http://tonsdeazul.blogspot.com/2009/08/um-estranho-na-sociedade.html
Boas leituras! :) Eu de momento estou a descobrir a escrita de David Soares, com "Os Ossos do Arco-Íris"
Vim espreitar qual era o próximo.
ResponderEliminarAinda não li nada do Robert Wilson.
tonsdeazul: Nunca li nada do David Soares, mas ando curiosa, porque tenho lido coisas boas sobre ele. Fico a aguardar a tua opinião. :)
ResponderEliminarredonda: É a minha estreia com o Robert Wilson. Avancei pouco no livro, mas tenha a impressão que vai ser muito bom... :)
N. Martins já o li e gostei imenso da sua escrita. Muito diferente de tudo o que tenho lido. Não sabia o que me esperava e no início achei um pouco estranha, pois por vezes chega a ser cruel, crua e negra, mas este livro engloba três contos (que não são nada mesmo de encantar) muito bem escritos e prendem-nos até ao fim, mesmo que, por vezes, nos repugne! Agora quero mesmo ler "O Envangelho do Enforcado", pois parece-me que vou encontrar algo diferente d'"Os Ossos dos Arco-Íris".
ResponderEliminarNem sempre coloco as minhas opiniões literárias no tonsdeazul, pois tenho um grave problema :) não gosto de escrever logo a seguir que os leio. É raro isso acontecer. Por isso é que a maioria das vezes coloco citações sobre eles. :)
Não sabia que a minha opinião sobre "O Estrangeiro" te tinha levado a experimentar Camus! É sempre bom saber. :)
Tenho lido críticas muito positivas ao "O Envangelho do Enforcado" e pela tua opinião sobre "Os Ossos do Arco-Íris" parece que vou ter mesmo de ler alguma coisa do autor...
ResponderEliminarComigo é o contrário, como a minha memória não é das melhores, se não opino logo acabo por ir "esquecendo". O blogue acaba por funcionar como uma cábula. :)
A tua foi uma das opiniões que me fez pegar no Albert Camus quando pesquisei um pouco sobre ele na net. Só quando segui o link que me deste é que me apercebi que já a tinha lido há uns meses... Outra vez o tal problematizo da memória! :/
Camus é excepcional e a Peste é um dos seus melhores livros.
ResponderEliminarExpoente máximo do existencialismo francês, Camus foi um escritor brilhante mas também um grande homem. Li este livro há muitos anos e hei-de reler.
Aconselho-te também O Mito de Sisifo, se bem que mais filosófico (é uma leitura difícil mas vale a pena).
Manuel, acho que foi uma boa maneira de entrar na obra de Camus. Tenho a certeza de que vou ler mais coisas dele pois gostei muito da maneira como ele escreve. :)
ResponderEliminarConsegui arranjar A Peste e comecei a ler :)
ResponderEliminarUm dos «meus»...
ResponderEliminar:)
Acabei ontem. Gostei e também concordo com o que achaste quanto à distância do narrador e momentos mais dramáticos. Camus escreve mesmo bem. E entretanto lembrei-me que há muitos anos atrás li O Estrangeiro. Foi mesmo há muito tempo, quando teria à volta de 11, 12 anos. Só me lembro que o achei sério e não gostei. Estou a pensar em voltar a lê-lo e ver se me recordo mais do que li antes :)
ResponderEliminarum beijinho (e tenho estado atenta e curiosa sobre qual vai ser o teu próximo livro :)
Li o Estrangeiro já à muitos aninhos e adorei contudo não li mais nada de Camus, mas certamente que as minhas maninhas têm alguns pois já ouvi maravilhas cá em casa sobre a Peste.
ResponderEliminarBoas leituras. :)
Carla: É um bom livro e ando muito curiosa para ler o Estrangeiro. :)
ResponderEliminarAcabei de ler, há cerca de um mês, O ESTRANGEIRO, grande, grande livro, aconselho vivamente.
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