junho 11, 2012

Mau Tempo no Canal - Vitorino Nemésio

Título original: Mau Tempo no Canal
Ano de edição: 1944 
Autor: Vitorino Nemésio 
Editora: INCM - Imprensa Nacional Casa da Moeda

"«Creio que o isolamento de cada ilha açoriana dá lugar à constante presença de um fantástico individual, que percorre de um modo exemplar o romance de Nemésio, desde a personagem mais singela até à de maior complexidade. Fantástico individual que está em luta aberta contra um maravilhoso colectivo. Assistimos a um descer dentro de cada um, como se dentro de si pisassem os degraus da escada em curva - perfeita sucessão de serpentes cegas - que levam, na geografia insular, ao lago subterrâneo da ilha Graciosa; a única das cinco ilhas centrais que as páginas de Mau Tempo no Canal não contemplam.»"                                                                                       
                                                             Do prefácio de João Miguel Fernandes Jorge

Mau Tempo no Canal é um livro sobre os Açores, mas não é bem um livro sobre os Açores. Foi escrito nos Açores, a acção tem lugar no Arquipélago, as personagens são açorianas, no entanto, a história poderia passar-se em qualquer outra ilha perdida no meio de um qualquer oceano. Posto isto, Mau Tempo no Canal é, para além de muitas outras coisas, um livro sobre o isolamento e sobre as amarras da sociedade que nos impõem caminhos que na realidade não desejamos. Tendo como pano de fundo o Canal do Faial, Vitorino Nemésio vai-nos contando uma história de amor, que acaba por não o ser, aliás, poucas são as coisas que correm como planeado neste livro. :) A protagonista, Margarida Clark Dulmo é uma filha da terra, pertencente a uma das famílias mais antigas e respeitáveis da ilha. Margarida é uma miúda inteligente, divertida, corajosa e sonhadora. Todos os seus sonhos acabam, no entanto, por ir contra ao que a família espera dela, um casamento conveniente que permita à família recuperar algum do fulgor económico que perdeu, com a má gestão do pai, Diogo Dulmo, e com a cada vez mais rara caça de baleias.
O livro começa com a promessa de uma história de amor entre Margarida e João Garcia, um rapaz não tão bem-visto no seio dos Clark Dulmo. João Garcia parte para o continente para cumprir serviço militar, deixando Margarida quando ainda havia muito pouco para recordar, no entanto, o que sente por ela em vez de desaparecer, cresce e Margarida acaba por se tornar na única mulher que realmente amou. Margarida, pelo contrário, acaba por afastar João Garcia, embora ao longo do livro se perceba que sente por ele mais do que quer dar a entender. Na verdade, Margarida, nos dias de hoje seria, provavelmente, uma mulher concentrada na carreira profissional, sem procurar a felicidade numa relação amorosa, mas sim no seu desenvolvimento pessoal. Posto isto e, tendo em conta que a acção se desenrola entre 1917 e 1919, num sítio rodeado por mar, podemos intuir que a vida de Margarida não será propriamente fácil e as suas escolhas serão tudo menos pacíficas. :) Tendo sempre presente que, num meio pequeno, de certa forma isolado, todos os problemas parecem maiores, todos os dilemas, questões de vida ou morte. Neste aspecto, Margarida não é muito diferente de todas as outras pessoas da ilha.

É com pena que chego ao fim deste livro sem ter gostado especialmente dele. Não me identifiquei com a escrita elaborada de Vitorino Nemésio, não me conseguiu envolver nas vidas das personagens ou mesmo fazer sentir o ambiente das ilhas. Manter a concentração foi o maior desafio que encontrei neste livro. No entanto, embora não tenha ficado impressionada com ele, fiz um esforço extra para tentar chegar ao fim (confesso que saltei parágrafos) queria saber como acabava tudo. A história é boa, a forma com nos é contada é que, pessoalmente, não me cativou. Gostei, por exemplo, dos diálogos, da escrita em "açoriano" praticamente indecifrável mas que ajudavam a criar o ambiente vivido e gostei de algumas descrições. A forma como tudo isto está ligado, pareceu-me por vezes desconexo, confuso e com muitas descrições, para mim desnecessárias. Cheguei a mais de meio do livro e pensei em desistir, custava-me voltar a pegar nele, exactamente porque me sentia completamente desligada da história, tão desligada que a memória do que tinha lido era muito vaga e cheguei a confundir personagens... Só quando li algumas críticas é que me apercebi de que nem tudo acontecia na mesma ilha e que o canal separava a ilha do Pico e do Faial... (shame on me). Só voltei a pegar nele por puro despeito e, na realidade, lá mais para a frente a história ganha outro balanço e, como já referi, gostei da parte dos diálogos e por isso fui lendo. 

Não fiquei impressionada e duvido que alguma vez volte a ele, no entanto, não li nenhuma crítica negativa sobre ele, pelo contrário, sempre li coisas muito positivas sobre este livro. Sendo assim, não posso deixar de o recomendar, é muito provável que o problema seja meu! :)

Boas leituras!

Excerto:
" O mundo, aliás, nunca lhe aparecera tão vivo, representado na sua solidão de solteiro pela própria força do silêncio da noite e do esgotamento de um dia gasto à espera daquela mensagem de Margarida que dois meses enchiam de uma necessidade dolente e tornavam cada vez mais longínqua. Mas a própria intensidade e uso desse desejo criava em João Garcia um começo de palpitação daquilo por que esperava, como se a carta fosse o seu próprio cérebro excitado, e as sombra do fundo do quarto, o guarda-fato de espelho, o cubículo que lhe servia de escritório abafado em veludos puídos e me laçarotes encarnados derivassem da projecção do papel em que Margarida lhe escrevesse."

7 comentários:

  1. Não acho que quando não gostamos de um livro que a maioria gostou, o problema seja nosso.
    Concordo sim que, devido ao estilo e ao momento, não estejamos preparados e especialmente motivados a ler certas obras que, anos mais tarde e dentro de outro contexto, nos surgirão com outro significado e outra qualidade.
    Existem obra que necessitam de serem lidas com cuidado, calma e com algum poder de observação. Obras que necessitam que o leitor a elas se dedique por inteiro e o problema é que, por vezes, essas obras não nos cativam e depois ficamos a pensar que a ave rara somos nós.
    Não o creio!
    Eu já li muitos clássicos e muitos tenho para ler. Já li clássicos que adorei e outros que não gostei. Depois fui ler algumas críticas e percebi que não tinha tido a paciência para "apanhar" o fulcro, a assência do livro, não o tinha sabido interpretar.
    Nunca li "Mau Tempo no Canal", mas tenho-o para ler... um dia!

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  2. Iceman: É provável que tenhas razão. :) Quando leio as críticas ao "Mau Tempo no Canal", o livro continua a parecer-me muito interessante e, na realidade é, do que eu não gostei foi da forma como a história está estruturada, daí não tencionar voltar a ele. :) Há escritores assim, ou se gostam ou não, acho que Vitorino Nemésio é um dos que não gosto, por muito boas que sejam as suas histórias.
    Espero que consigas apreciar o livro, quando o leres.

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  3. É um livro que me suscita muita curiosidade, mas uma vez vi um documentário sobre a obra e fiquei com a sensação que este não seria um livro muito fácil de ler, que teria de ser lido no momento "dito" certo. Fui sempre adiando a leitura , mas a vontade em o ler continua. ;)

    Boa leitura do "Por Favor Não Matem a Cotovia", que tanto prazer me deu!

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  4. Alguém me sabe dizer a data concretamente do lançamento do livro "Mau Tempo no Canal" de Vitorino Nemésio? Para um trabalho sobre a sua biografia.
    Obrigado

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  5. O mito nemesiano cresceu à volta de dezenas e dezenas de personagens que não têm qualquer interesse psicológico ou social num fio que se perde em descrições longas e desnecessárias. A crítica foi muito benévola pois Nemésio conseguiu bons apoios. O livro não vale nada. A maravilha está toda em ver gente capaz a tentar incutir à obra o que ela não tem: Não passa de
    Um romance cor de rosa infantil muito martelado para colocar o "pitoresco (sic) e as notas de uma certa cultura que não é nada real. Tem Eça? Tem Tem Camilo? Tem Tem Cesário Verde? Tem. Tem despeito pessoal inequívoco? Tem Tem Antero? Claro
    A sopa de pedra ou o filão dourado para fingir literatura mas só de cordel e com uma paciência enorme para não vomitar de enjoo a meio do canal
    Mistura todos os estilos sem ter nenhum, imita o estilo russo, sem densidade, imita tudo o que pode como se escrevesse com uma lista de livros a consultar e a fingir que conhece o linguajar açórico. Feliz por ter sorte de apanhar um Borges Garcia, infeliz e inadaptado par passara vida a tornar o seu ídolo dourado
    A prova de que não vale nada? A lista de boa gente que se negou a ler tudo até ao fim
    Não é nada insular; a grande ilha São Miguel fica com todos os possíveis romances para criar um clima verdadeiramente insular. É HORA DE DIZER "O rei vai nu"

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  6. Se acaso alguém esteja interessado em comprar uma 1 edição, entrem em contacto comigo! Refacholopes@gmail.com
    Obrigado.

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