Ano da edição original: 1984
Autor: Richard Yates
Tradução: Miguel de Castro Henriques
Editora: Quetzal
"Michael Davenport e Lucy Blaine são um casal jovem e atraente. Michael formou-se em Harvard e tem a ambição de uma carreira literária; Lucy é bonita, discreta, culta e muito rica.
Recém-casados, mudam-se para Nova Iorque nos início dos anos 1950. Michael trabalha no seu primeiro livro de poemas, enquanto sustenta a família com um medíocre emprego diurno - paradoxalmente, em nome da sua liberdade criativa, recusa-se a tocar no dinheiro da sua mulher. Nesses anos, em que a contracultura Beat começa a dar os primeiros sinais, Michael e Lucy descobrem, por acidente, a nova boémia artística nova-iorquina. Embora deslocados e inseguros face à sofisticação e licensiosidade deste leque de fascinantes possibilidades sociais, sabem que encontraram o que procuravam. Porém, o curso dos acontecimentos e das relações (incluindo a deles, Michael e Lucy Davenport) deixá-los-á sempre algo aquém das suas expectativas.
Jovens Corações em Lágrimas demonstra mais uma vez a inigualável mestria de Richard Yates, o grande cronista do sonho Americano e das suas depressões."
Jovens Corações em Lágrimas é, mais uma vez, um livro onde nada parece correr bem às personagens. Página a página vamos vendo as decisões que tomam e vamos sentido que mais tarde ou mais cedo, algumas trarão consequências.
A história gira à volta do jovem casal Michael Davenport e Lucy Blaine.
Ele um aspirante a escritor, de origens humildes, formado em Harvard. Moderadamente conhecido por um poema que publicou quando era mais novo, e que lhe trouxe alguma notoriedade no meio.
Ela veio de uma família abastada, bonita e culta. Quando conhece Michael é uma jovem alegre, cheia de ideias e, fica um pouco fascinada pela cultura de Michael.
Conhecem-se, apaixonam-se, casam-se e têm uma filha. Michael, por orgulho, não aceita que Lucy utilize o dinheiro de família para os sustentar ou ajudar na sua carreira literária.
Enquanto trabalha no seu novo livro de poemas, o livro que sente o consagrará como um escritor de culto e de relevância, trabalha para uma revista, trabalho que lhe permite pagar as contas.
Vivem, por isso, sem luxos, num pequeno apartamento em Nova Iorque, cidade que fervilha de ideias, onde tudo acontece e onde vivem todas as novas mentes brilhantes do século XX.
Para Lucy, a mudança de vida é grande, mas respeita a decisão de Michael e, na verdade, sente-se feliz com o que tem. Sente-se encantada por Michael e pelo seu talento.
Os dois desejam pertencer à nova cena artística. Conhecem, por mero acaso, alguns desses artistas e começam a ser presença assídua nas festas e encontros do meio.
Parece que desejam pertencer a este meio mais do que desejaram alguma outra coisa nas suas vidas. Não querem apenas conhecer estas pessoas, artistas das mais diversas áreas, querem ser os seus melhores amigos. Querem pertencer e ser reconhecidos, pelo que acham ter para oferecer ao mundo.
São um casal apaixonado que vemos, inicialmente, com uma certa candura e inocência. Desejam ficar na história, de certa forma, mudar o mundo. São jovens e parecem ter tudo para serem felizes. No entanto, a constante insatisfação, a vontade de se destacarem e de pertencer, torna-os extremamente infelizes. Ao estarem tão focados nos outros, são incapazes de reconhecer neles próprios motivos para serem felizes.
Michael torna-se ciumento, amargurado e imensamente infeliz. Lucy, que sempre foi mais uma espectadora na vida dos dois do que propriamente participante, percebe que necessita de outras coisas na vida dela e afasta-se de Michael, divorciando-se dele.
Após a separação, e depois de uma fase inicial onde se sente perdida, Lucy, inicia um processo de autodescoberta onde experimenta a escrita, a pintura e a representação. Chegando à conclusão de que não é especialmente boa em nenhuma delas.
Michael, após a separação, oscila entre fases de profunda depressão, associadas à bebida, e fases de esperança alucinada.
O livro, embora até seja um livro volumoso, lê-se muito bem.
É um livro que nos põe a reflectir sobre a vida e sobre aquilo que nos faz felizes. Põe-nos a pensar sobre as pessoas da nossa vida e de como todos nós mudamos ao longo dos anos. Mudamos a muitos níveis, mudamos fisicamente, mudamos de opiniões, descobrimos de que afinal já não faz sentido perseguir algo que sonhamos ter desde sempre. Crescemos, mudamos e, acho que, se mantivermos a mente aberta, descobrimos coisas que nunca pensámos vir a descobrir quanto mais gostar.
Ter objetivos é muito bom, essencial até, mas estes objetivos têm de deixar algum espaço para a descoberta. Nem sempre a linha recta, sem possibilidade de desvios é o melhor caminho para alcançarmos o que quer que seja. Temos de tentar viver o melhor possível, com aquilo que sabemos e com o tempo que temos disponível.
Richard Yates não me desilude. Gosto dos livros dele e pronto, não há mais nada a dizer!
Recomendo e boas leituras!
Excerto:
"Ela então parou de falar, como se falar não a pudesse senão levar a um estado de exaustão, e Michael não tinha nada para dizer. Sentia-se mais fraco do que ressentido e sabia que nenhuma resposta seria adequada, por isso contraiu os maxilares para se impedir a si mesmo de responder de todo. De vez em quando, durante os intervalos da estrada em que não se viam árvores, olhou para as estrelas que cintilavam no céu escuro como se lhes perguntasse se alguma vez - alguma vez - chegaria a altura em que ele faria algo como deveria ser."