Título original: Sunset Park
Ano da edição original: 2010
Autor: Paul Auster
Tradução: José Vieira de Lima
Editora: Edições ASA
Ano da edição original: 2010
Autor: Paul Auster
Tradução: José Vieira de Lima
Editora: Edições ASA
"Durante os meses sombrios do colapso económico de 2008, quatro jovens ocupam ilegalmente uma casa abandonada em Sunset Park, um bairro perigoso de Brooklyn.
Bing, o cabecilha, toca bateria e dirige o Hospital das Coisas Escangalhadas, onde conserta relíquias de um passado mais próspero. Ellen, uma artista melancólica, é assaltada por visões eróticas. Alice está a fazer uma tese sobre a forma como a cultura popular encarava o sexo no pós-guerra. Miles vive consumido por uma culpa que o leva a cortar todos os laços familiares. Em comum têm a busca por coerência, beleza e contacto humano.
São quatro vidas que Paul Auster entrelaça em tantas outras para criar uma complexa teia de relações humanas, num romance sobre a América contemporânea e os seus fantasmas."
Paul Auster é um dos meus escritores preferidos. Um contador de histórias, original na forma como passa a mensagem. Um narrador de emoções e de pessoas. Gosto da forma como escreve e das pessoas que habitam as histórias de Auster.
Sunset Park não é um livro menor, mas é um livro onde a imaginação e a sensação de irrealidade que muitas vezes povoam os livros de Auster não estão tão presentes. É, de certa forma, um livro mais normal.
Miles após um acontecimento traumático que não consegue ultrapassar, decide partir, afastar-se de tudo e de todos. Abandona a universidade e a perspectiva de uma carreira brilhante, os pais e a madrasta. Parte sem destino e sem planos e a única pessoa com quem mantém contacto é com Bing, uma espécie de amigo, que de certa forma o mantém ligado a Nova Iorque e à família. Através dele vai sabendo do pai e da madrasta e também da mãe, uma estrela de Hollywood. Miles nunca mais falou com ninguém, a não ser com Bing. Bing, sem que Miles o saiba, vai mantendo os pais deste informados das andanças do filho, tornando os sete anos de ausência - ausência de notícias e de explicações - menos dolorosos.
Ao fim de sete anos, vê-se obrigado a regressar a Nova Iorque e é acolhido por Bing, tornando-se no mais recente habitante da casa abandonada em Sunset Park, que Bing e duas amigas, Ellen e Alice, ocupam, de forma ilegal.
Reata relações com o pai e com a mãe e dá-lhes, finalmente, as explicações possíveis. É recebido de braços abertos, mas o pai, com quem mantinha uma relação mais chegada, tem alguma dificuldade em voltar a abrir de forma incondicional o seu coração a um filho que o abandonou, sem que houvesse espaço para um telefonema, uma carta, um recado, o que quer que fosse, durante os longos sete anos em que aguardou pacientemente que o filho se reencontrasse e decidisse voltar. A madrasta, a mulher que o criou após o divórcio dos pais e o afastamento da mãe, encontra ainda mais dificuldades em compreender os motivos de Miles e recusa-se a falar com ele.
Grande parte da história roda à volta de Miles e da sua personalidade. Fechado sobre si mesmo, com dificuldades em partilhar com os outros os medos, os anseios e aquilo que tanto o atormenta. Para os outros, Miles surge como uma figura misteriosa e portanto encantador e atraente. Uma pessoa com um passado doloroso, ferido de uma forma profunda e inegavelmente inteligente. Na realidade Miles acaba por ser pouco mais do que um egoísta, com muita dificuldade em pensar para além do seu umbigo e dos seus problemas. Não é consciente do seu egoísmo, ou seja, não alimenta de forma consciente a admiração e o fascínio que parece provocar nos outros. Mas para mim, não passa de um egoísta e de um cobarde. Não regressa a casa porque sente que já lidou com todos os seus fantasmas, nem porque sente que o sofrimento dos pais deva chegar ao fim. Regressa porque se vê obrigado a isso, porque precisa de fugir de uma outra situação em que se viu envolvido. Ao regressar pelos motivos errados o que faz no fim do livro não deveria surpreender, no entanto, a mim surpreendeu-me... Fui apanhada na "receita" de Auster, onde ao longo dos livros, que já li dele, tudo corre mal mas no fim, a sensação que fica é de esperança, de que o caminho das personagens que deixamos de acompanhar, após o último ponto final, na última página, será menos penoso. Este Sunset Park, é um bocadinho o inverso, nada corre excepcionalmente mal durante toda a história e no fim, não há redenção ou esperança. No último ponto final, não diria que todas as personagens estejam piores, mas Miles ainda tem um longo caminho a percorrer e não sinto que exista muita esperança na sua recuperação. :)
Paralela à história de Miles, Paul Auster explora a crise imobiliária que atingiu os EUA em 2008. As pessoas que tiveram de abandonar as casas e entregá-las aos bancos, o desemprego e a falta de perspectiva dos jovens, obrigados, no limite, a ocupar espaços abandonados por não terem dinheiro para fazer face às despesas do dia-a-dia. Uma visão do sonho americano transformado em pesadelo.
Não sendo o livro que mais gostei, até agora, do Paul Auster, é um livro que vale pela envolvência, pelas personagens e por toda a bagagem que Paul Auster transporta para as suas histórias, que se transformam em múltiplas histórias dentro da história. Só posso recomendar. :)
Boas leituras!
Excerto (pág. 7):
"Há cerca de um ano que ele fotografa coisas abandonadas. Há pelo menos dois trabalhos todos os dias, por vezes até seis ou sete, e, sempre que entram numa nova casa, ele e os seus colegas vêem-se confrontados com as coisas, as inúmeras coisas rejeitadas, tudo aquilo que as famílias deixaram. As pessoas ausentes, todas elas, fugiram precipitadamente, humilhadas, confusas, e é certo e seguro que, onde quer que vivam agora (se é que encontraram um sítio para viver e não estão acampadas nas ruas), os seus novos alojamentos são mais pequenos do que as casas que perderam. Cada casa é uma história de fracasso - de bancarrota e falta de pagamento, de dívidas e execução de hipotecas - e ele tomou a seu cargo a tarefa de documentar os derradeiros resquícios dessas vidas dispersas, a fim de provar que as famílias desaparecidas estiveram em tempos ali, que os fantasmas das pessoas que ele nunca verá e nunca conhecerá ainda estão presentes nas coisas rejeitadas que ele e os seus colegas encontram espalhadas por todo o lado nas casas vazias."
Ao fim de sete anos, vê-se obrigado a regressar a Nova Iorque e é acolhido por Bing, tornando-se no mais recente habitante da casa abandonada em Sunset Park, que Bing e duas amigas, Ellen e Alice, ocupam, de forma ilegal.
Reata relações com o pai e com a mãe e dá-lhes, finalmente, as explicações possíveis. É recebido de braços abertos, mas o pai, com quem mantinha uma relação mais chegada, tem alguma dificuldade em voltar a abrir de forma incondicional o seu coração a um filho que o abandonou, sem que houvesse espaço para um telefonema, uma carta, um recado, o que quer que fosse, durante os longos sete anos em que aguardou pacientemente que o filho se reencontrasse e decidisse voltar. A madrasta, a mulher que o criou após o divórcio dos pais e o afastamento da mãe, encontra ainda mais dificuldades em compreender os motivos de Miles e recusa-se a falar com ele.
Grande parte da história roda à volta de Miles e da sua personalidade. Fechado sobre si mesmo, com dificuldades em partilhar com os outros os medos, os anseios e aquilo que tanto o atormenta. Para os outros, Miles surge como uma figura misteriosa e portanto encantador e atraente. Uma pessoa com um passado doloroso, ferido de uma forma profunda e inegavelmente inteligente. Na realidade Miles acaba por ser pouco mais do que um egoísta, com muita dificuldade em pensar para além do seu umbigo e dos seus problemas. Não é consciente do seu egoísmo, ou seja, não alimenta de forma consciente a admiração e o fascínio que parece provocar nos outros. Mas para mim, não passa de um egoísta e de um cobarde. Não regressa a casa porque sente que já lidou com todos os seus fantasmas, nem porque sente que o sofrimento dos pais deva chegar ao fim. Regressa porque se vê obrigado a isso, porque precisa de fugir de uma outra situação em que se viu envolvido. Ao regressar pelos motivos errados o que faz no fim do livro não deveria surpreender, no entanto, a mim surpreendeu-me... Fui apanhada na "receita" de Auster, onde ao longo dos livros, que já li dele, tudo corre mal mas no fim, a sensação que fica é de esperança, de que o caminho das personagens que deixamos de acompanhar, após o último ponto final, na última página, será menos penoso. Este Sunset Park, é um bocadinho o inverso, nada corre excepcionalmente mal durante toda a história e no fim, não há redenção ou esperança. No último ponto final, não diria que todas as personagens estejam piores, mas Miles ainda tem um longo caminho a percorrer e não sinto que exista muita esperança na sua recuperação. :)
Paralela à história de Miles, Paul Auster explora a crise imobiliária que atingiu os EUA em 2008. As pessoas que tiveram de abandonar as casas e entregá-las aos bancos, o desemprego e a falta de perspectiva dos jovens, obrigados, no limite, a ocupar espaços abandonados por não terem dinheiro para fazer face às despesas do dia-a-dia. Uma visão do sonho americano transformado em pesadelo.
Não sendo o livro que mais gostei, até agora, do Paul Auster, é um livro que vale pela envolvência, pelas personagens e por toda a bagagem que Paul Auster transporta para as suas histórias, que se transformam em múltiplas histórias dentro da história. Só posso recomendar. :)
Boas leituras!
Excerto (pág. 7):
"Há cerca de um ano que ele fotografa coisas abandonadas. Há pelo menos dois trabalhos todos os dias, por vezes até seis ou sete, e, sempre que entram numa nova casa, ele e os seus colegas vêem-se confrontados com as coisas, as inúmeras coisas rejeitadas, tudo aquilo que as famílias deixaram. As pessoas ausentes, todas elas, fugiram precipitadamente, humilhadas, confusas, e é certo e seguro que, onde quer que vivam agora (se é que encontraram um sítio para viver e não estão acampadas nas ruas), os seus novos alojamentos são mais pequenos do que as casas que perderam. Cada casa é uma história de fracasso - de bancarrota e falta de pagamento, de dívidas e execução de hipotecas - e ele tomou a seu cargo a tarefa de documentar os derradeiros resquícios dessas vidas dispersas, a fim de provar que as famílias desaparecidas estiveram em tempos ali, que os fantasmas das pessoas que ele nunca verá e nunca conhecerá ainda estão presentes nas coisas rejeitadas que ele e os seus colegas encontram espalhadas por todo o lado nas casas vazias."
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