Ano da edição original: 1884
Autores: Eça de Queirós e Ramalho OrtigãoRevisão: Bernardo de Brito e Cunha (Projeto Adamastor)
"Naquele que é justamente considerado o primeiro romance policial português, conta-se a história de um médico que regressa de Sintra acompanhado por um amigo. A meio do caminho, ambos são raptados por um grupo de mascarados, que os levam para um prédio isolado onde aparecera um homem morto. A partir daí, os acontecimentos sucedem-se em catadupa. Quem é o morto e quem o matou? E porquê? Quem era a mulher com quem ele se encontrava, e quem são os mascarados que pretendem proteger a sua honra? A história foi publicada no Diário de Notícias entre Julho e Setembro de 1870 sob a forma de cartas anónimas, e foram muitos os que se assustaram com os acontecimentos narrados. Só no final é que Eça de Queirós e Ramalho Ortigão admitiram tratar-se de uma brincadeira e que eram eles os autores das cartas. O Mistério da Estrada de Sintra foi publicado em forma de livro nesse mesmo ano. Em 1885, houve uma segunda edição revista por Eça de Queirós, que é a utilizada na presente edição."
Um regresso aos clássicos portugueses, com este O Mistério da Estrada de Sintra, escrito a duas mãos por Eça de Queirós e Ramalho Ortigão. Este tem sido, ao longo dos anos, um daqueles livros que de vez em quando me vinha à cabeça como que a relembrar-me de que gostaria de o ler. Foi desta que me veio parar às mãos.
O Mistério da Estrada de Sintra é uma história típica da época, embora esteja longe de ser apenas uma história típica e previsível. É típica por ser uma historia de amores impossíveis, dramáticos e fatais e não é apenas uma história típica porque está envolta em mistério, com personagens menos óbvias e cenários inesperados.
O livro começa com a intercepção de dois amigos (muito parecidos com Eça e Ramalho), no caminho de Sintra para Lisboa, por um grupo de homens mascarados que não se identificam e que lhes pedem que os acompanhem. Onde?, não dizem. Os dois são vendados e elevados até uma casa isolada, que não conhecem e onde vão encontrar um homem morto... :) E mais não digo, porque o que mais me prendeu à leitura foi não saber nada sobre a história e todo o ambiente misterioso que os escritores conseguiram criar.
O que se passa com eles naquela casa leva a que um deles, quando sai, sem que tenha conseguido esclarecer o que lhe aconteceu e o porquê, decida escrever para um editor de jornal uma carta onde relata o que lhes aconteceu. A carta é publicada e alguns dos intervenientes na história manifestam-se, também por cartas, que vão sendo publicadas no jornal. É desta forma que vai sendo desvendado o mistério que levou aqueles homens àquela casa e o que os levou à estrada de Sintra para "raptarem" os dois amigos.
Até mais ou menos metade do livro, não fazia ideia do que estava por detrás do acontecimento misterioso que apanhou desprevenidos os nossos escritores na Estrada de Sintra. Gostei muito dessa vertente do livro e achei a história original e as personagens muito bem construídas e interessantes.
Recomendo como é natural!
Boas leituras!
Excerto:
"Demos alguns passos, subimos dois degraus de pedra, tomámos à direita e entrámos na escada. Era de madeira, íngreme e velha, coberta com um tapete estreito. Os degraus estavam desgastados pelos pés, eram ondeados na superfície e esbatidos e arredondados nas saliências primitivamente angulosas. Ao longo da parede, do meu lado, corria uma corda, que servia de corrimão; era de seda e denotava ao tacto pouco uso. Respirava-se um ar húmido, impregnado de exalações interiores dos prédios desabitados. Subimos oito ou dez degraus, tomámos à esquerda num patamar, subimos ainda outros degraus e parámos num primeiro andar.
Ninguém tinha proferido uma palavra, e havia o que quer que fosse de lúgubre neste silêncio que nos envolvia como uma nuvem de tristeza.
Ouvi então a nossa carruagem que se afastava, e senti uma opressão, uma espécie de sobressalto pueril.
Em seguida rangeu uma fechadura e transpusemos o limiar de uma porta, que foi outra vez fechada à chave depois de havermos entrado.
Ninguém tinha proferido uma palavra, e havia o que quer que fosse de lúgubre neste silêncio que nos envolvia como uma nuvem de tristeza.
Ouvi então a nossa carruagem que se afastava, e senti uma opressão, uma espécie de sobressalto pueril.
Em seguida rangeu uma fechadura e transpusemos o limiar de uma porta, que foi outra vez fechada à chave depois de havermos entrado.
- Podem tirar os lenços - disse-nos um dos nossos companheiros.
Descobri os olhos. Era noite."