outubro 19, 2009

O Deus Das Moscas - William Golding

"Um grupo de rapazes abandonados numa ilha deserta desfruta da liberdade total festejando a ausência de adultos. Porém, à medida que o frágil sentido de ordem dos jovens começa a colapsar, também os seus medos começam a tomar sinistras e primitivas formas. De repente, o mundo dos jogos, dos trabalhos de casa e dos livros de aventuras perde-se no tempo. Agora, os rapazes confrontam-se com uma realidade muito mais urgente - a sobrevivência - e com o aparecimento de um ser terrível que lhes assombra os sonhos."

Este é um livro perturbador. É a primeira coisa que me ocorre quando penso nele. Já o li há uns meses, mas continuam na minha cabeça imagens dos últimos capítulos do livro. A subtil alteração que vai ocorrendo com estes rapazes, pré-adolescentes, que se vão tornando cada vez mais primitivos, territoriais, guerreiros de palmo e meio que lutam pelo poder como gente grande.

Um avião cheio de rapazes, entre os 6 e 12 anos, ingleses despenha-se numa ilha deserta. Nenhum adulto sobrevive. Temos pois, um bando de rapazes que se vêm livres de qualquer controlo parental e de todas as regras impostas pelos adultos. Com a certeza de que serão salvos mais cedo ou mais tarde, decidem que devem aproveitar e divertirem-se à grande. O que poderá correr mal? Pelos vistos muita coisa...
Corre mal o facto de que o ser humano, quando se encontra livre de regras e de alguém que julgue os seus actos, ser capaz de coisas atrozes.
Corre mal quando na ânsia de acalmar medos primitivos e de encontrar um sentido para as coisas, procuramos ajuda nos sítios errados, procuramos liderança e deixamos de ser indivíduos e passamos a ser ovelhas num rebanho cego e obediente. Entregamos o poder nas mãos de quem não merece e idolatramos as pessoas erradas. Entramos numa histeria de grupo que não é complacente com o que nos distingue dos outros animais, a racionalidade e a consciência.
Isso torna-se ainda mais perturbador quando tudo isso é exemplificado num bando de miúdos que, em pouco mais de uns dias, perde toda e qualquer noção do bem e do mal e do respeito pela vida humana e não humana.
Apenas duas das crianças demonstram bom-senso, uma delas é morta pelos colegas, a outra vive atormentada pelo facto de não ter sido capaz de os manter mentalmente sãos, por ter perdido o controlo e por sentir medo. Medo de perder a pouca sanidade que lhe resta e tornar-se num deles, medo de não ser salvo, medo de morrer.

No fim são salvos mas a inocência e a infância ficam na ilha, agora meio destruída, onde descobriram a capacidade de matar, para alguns até o gosto de matar.

O livro vale sobretudo pela história. O que parece inicialmente um livro para adolescentes ao estilo de Robinson Crusoé ou A Ilha do Tesouro, torna-se em algo completamente diferente. Está cheio de cenas arrepiantes e bem conseguidas. Não está especialmente bem escrito, principalmente quando o autor tenta descrever os vários sítios da ilha, torna-se confuso e é difícil situar geograficamente a acção. Mas é definitivamente um daqueles livros que se devem ler. Foi-me sugerido pelo meu mais que tudo, que embora não o tivesse lido, ouviu falar dele e, como sempre foi uma óptima sugestão! Gostei muito de o ler.

2 comentários:

  1. É um dos melhores livros que li até hoje!
    perturbadora a análise da maldade humana, da tentação do poder, dos instintos mais animalescos que habitam em nós e que as crianças exprimem da forma mais crua e fria.
    Um livro que nos faz chocar de frente com a nossa condição de seres naturais, animais...
    PS-este blog promete! os meus votos que assim continue...

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  2. É de facto um livro perturbador, por isso mesmo que diz, faz-nos "chocar de frente com a nossa condição de seres naturais, animais...". E por o autor representar isso em crianças, com acesso à educação, naturais de um país que é conhecido por prezar muito as boas maneiras, a Inglaterra. Irónico, não? Eu gostei mesmo muito.
    Espero continuar a merecer a sua visita. :)

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