junho 06, 2010

A Leste do Paraíso (Vol.II) - John Steinbeck

" A Leste do Paraíso, vasto fresco levantado a partir do relato da vida de várias gerações de duas famílias norte-americanas, os Trask e os Hamilton, num período crucial da história dos Estados Unidos (1860. Guerra da Secessão - 1920, anos imediatos à Primeira Grande Guerra), proporcionou ao malogrado James Dean talvez o mais importante papel da sua carreira."

E acabei o segundo volume (primeiro volume comentado aqui) desta obra magnífica do John Steinbeck. Para mim, é neste segundo volume que se encontra o mais importante do livro e o mais interessante da história.

Neste segundo volume, os gémeos, Caleb e Aaron, filhos de Adam e Cathy, cresceram, a família Trask abandonou o rancho e mudou-se para Salinas.
Aaron é loiro e de olhos claros e é fisicamente muito parecido com a mãe mas, em termos de personalidade será mais parecido com o pai, é um sonhador e idealiza demasiado as pessoas que ama, não conseguindo apreender a verdadeira essência de quem o rodeia. Todos gostam de Aaron, todos se sentem atraídos por ele, como se ele necessitasse de protecção, por causa da aparência frágil que exibe. No entanto, é um miúdo que quando se irrita ou quando se sente ameaçado se torna extremamente violento, ficando mais parecido com o seu tio Charles do que com o pai, que é completamente avesso a qualquer tipo de violência.
Criou uma história para si: casará com Abra, uma criatura pura e perfeita, e faz questão de acreditar que a mãe morreu sendo ela também pura e perfeita. Vive numa bolha, fora da realidade e, no dia em que alguém o força a sair do mundo que criou, lida mal com a descoberta de que no sangue dele correm o pecado e a perversão.

Caleb é muito diferente do irmão, moreno com uma atitude de constante desafio que esconde a necessidade enorme que tem de ser amado e acarinhado. Fisicamente é mais parecido com o tio Charles, mas tem uma personalidade muito vincada, é muito inteligente e conhece a fundo todos os que o rodeiam. No entanto, sofre com a maldade que sente dentro dele, que luta para reprimir mas que por vezes não consegue. Quando descobre quem é a mãe, julga estar condenado a ser como ela, pois só a hereditariedade poderá explicar o ódio e o ciúme que sempre o acompanharam. Ama o irmão, mas tem ciúmes dele e ama o pai, procurando sempre a sua aprovação. É um miúdo extremamente carente, que para se proteger constrói um muro à sua volta, passando por arrogante e perigoso.
É o responsável pelos acontecimentos mais dramáticos da história mas o que sentimos é sempre uma vontade enorme de o confortar e aliviar-lhe o sofrimento em que vive. Chegamos a odiar a fraqueza de Adam por ser desatento às necessidades dos filhos e por se ter deixado morrer por dentro quando a mulher o abandonou. Chegamos a odiar Aaron, por ser tão egoísta e tão desligado da realidade e do irmão. Sofremos com Caleb os conflitos interiores que o atormentam e com a inevitabilidade do que acaba por acontecer.
Caleb e Abra acabam por ser as personagens mais reais deste livro, são humanos, comentem erros, têm defeitos e aprendem a viver com isso. São as personagens mais fortes da história.

John Steinbeck faz no A Leste do Paraíso uma construção de personagens notável. Estas diferenças entre dois irmãos, gémeos, criados da mesma forma mas que se apresentam tão diferentes um do outro. A influência que a genética tem na nossa vida, mas particularmente a enorme importância que a educação tem na formação da nossa personalidade.
Uma das palavras mais importantes da história que está presente, implicitamente, em todas as acções é a palavra hebraica Timshel, que surge no quarto capítulo do Génesis, a passagem de Abel e Caim. Deus, quando condena Caim a vaguear pela terra, diz-lhe, segundo a versão hebraica, que ele pode (timshel) dominar sobre o pecado, o que significa liberdade de escolha entre o bem e o mal. Embora todos nós, segundo a Bíblia, descendamos de Caim, um fratricida, todos nós somos responsáveis pelas nossas escolhas e não podemos desculpar as nossas acções com os erros cometidos pelos nossos antepassados. É uma mensagem muito forte ao longo de todo o livro.
A referência à passagem de Abel e Caim não é inocente, porque esta passagem é discutida por Adam, Lee e Samuel, no primeiro volume, quando procuravam na Bíblia nomes para os gémeos. A semelhança entre a histórias dos irmãos da Bíblia e os irmãos do livro de Steinbeck é muita. E a verdade é que, tal como na Bíblia, um dos irmãos acaba por ser indirectamente responsável pela morte do outro.
Não posso esquecer a família Hamilton, tão caricata, com todos os irmãos tão diferentes uns dos outros. O que me fica desta família é, ao contrário dos Trask, que nunca foram uma família na verdadeira acepção da palavra, é a solidariedade e o amor verdadeiro que todos os membros dos Hamilton sentem uns pelos outros, mesmo tendo personalidades tão distintas. Fiquei triste com o fim trágico e prematuro de alguns dos seus membros.
Por último, a mãe dos gémeos, Cathy, a tal que Steinbeck apelidou de monstro. Gostei muito da maneira como ela é descrita no livro, gostei do rumo que a vida dela toma e gostei da forma como acaba. É uma personagem fascinante, como todos os monstros podem ser. :)

Mais uma nota, num post que já vai longo, aconselho verem o filme East Of Eden com o malogrado James Dean no papel de Caleb Trask e o Richard Davalos no papel de Aaron Trask. Quando dei de caras com o filme no meu vídeo-clube fiz questão de o ver, e eu não sou nada dada a filmes antigos. É para verem quanto gosto desta história! :)

Leiam que vale a pena! :)

2 comentários:

  1. Monstro é Steinbeck, monstro eterno da literatura, obviamente!

    Parabéns pelo blogue, é uma maravilha.

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  2. SEVE: Steinbeck é realmente grande e eterno!
    Obrigada pelo elogio, faz-se o que se pode! :)

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