julho 26, 2010

Vale Abraão - Agustina Bessa-Luís

"Ema bate-se contra a rede de pequenas e formidáveis misérias que se apertam em volta dela. Heroína provinciana das insatisfações típicas do ser humano, Ema conserva, ao morrer, a independência de espírito que fez a Margarida Navarra escrever nas suas Prisões: «Porque de [Deus] me tivesse dado carta branca / Para atravessar esta prancha mortal, / Eu não teria ousado pedir tantos bens / Quanto ele me deu, que todos tenho dele; / E dos seus dons e bens eu fiz mau uso.»

Ema usou de carta branca para atravessar a vida. É um crime? Uma loucura? Um ritual da tristeza? É, acima de tudo, um sentimento atávico que as mulheres cultivam e que está longe de servir a concupiscência. É o sentido de pertencer a um mundo melhor e para ele avançar mesmo à custa dos mais cruéis mal-entendidos."

E à segunda vez que tento ler este livro consigo acabá-lo, não sem algum esforço e paciência. :) Fico sempre frustrada quando pego em autores, clássicos e acarinhados pelo público, como é o caso de Agustina Bessa-Luís e, não gosto do que leio. Deixa-me sempre uma sensação de não estar a perceber alguma coisa... Encontrei beleza nas palavras escritas e nalgumas ideias e descrições, que chegam a ser poéticas. Mas a sensação final foi de aborrecimento mortal. A história é chata, cheia de ideias confusas e repetitivas e a maneira como está escrita não me cativou nem um pouco. A parte inicial até se lê bem, mas a páginas tantas a história é difícil de seguir e o livro começa a ficar muito chato. Já só espero o momento em que Ema finalmente acabe com o seu (e meu) sofrimento e se suicide, porque achei que seria o fim mais provável para ela. Enganei-me, mas sinceramente nessa altura já não me interessava e já estava a a saltar parágrafos... :/

Esta é uma história de adultério, personalizado na Bovarinha portuguesa, Ema. A história passa-se nas margens do Douro vinhateiro, repleto de quintas bucólicas e em decadência, tal como a burguesia portuguesa. Atravessa a revolução dos cravos, com todas as mudanças sociais que daí resultaram, com a emancipação das mulheres e a crescente importância destas na sociedade portuguesa.
Ema é uma mulher insatisfeita, com desejos que ela própria tem dificuldade em definir. Dona de uma beleza estonteante, cedo começa a sentir por parte dos outros uma animosidade que, ao contrário de a surpreender, a faz sentir merecedora do desprezo. Os homens desprezam-na porque sentem na beleza dela algo de perigoso, têm medo do que não compreendem e desprezam-na. Ema procura ser amada, e vive num limbo entre querer um príncepe encantado que a tire da mediocridade, sustentando-a e tratando-a como um ser belo e digno de adoração e, o desejo que tem de ser independente e respeitada pelo que é e não pelo que esperam que ela seja. Quer um amor de conto de fadas mas, ao mesmo tempo tem um interesse pelos homens muito superficial. Casa-se com Carlos Paiva, um médico de província medíocre e sem verdadeiro talento. Carlos tem relativamente a Ema uma atitude de adoração e medo. Deseja-a e ama-a muito, mas não encontra nele habilidade para lidar com uma mulher como Ema. Passa então a fingir desprendimento e deixa-a a fazer tudo o que quer, com medo de a perder. Facilita-lhe os adultérios e finge não saber deles. Ema torna-se extravagante, com atitudes que provocam a maledicência do círculo restrito que forma a alta sociedade de Vale Abraão. Ainda antes de ter feito algo de moralmente reprovável já todos a tinham como adúltera e moralmente duvidosa.
No fundo esta uma história de uma mulher comum, que pensa poder ser especial e que luta contra a vulgaridade da vida e contra as rotinas impostas pela sociedade. No entanto ela própria, é incapaz de sair da mediocridade que também lhe é confortável. É uma mulher presa entre dois mundos e que vive saltando entres os dois, num frenesim que a esgota e oprime.

Dito desta forma, até parece interessante, e no início, como disse, até é. Depois torna-se nebuloso e cansativo. Em todas a páginas existem reflexões sobre o sexo, o prazer e o amor, feitas de uma forma confusa e repetitiva. A linha temporal do livro é muito difícil de seguir. A morte das personagens é anunciada, mas algumas páginas à frente lá estão elas em amena cavaqueira. É frustrante não conseguir discernir no meio de tanto andar para a frente e para trás, que coisas já aconteceram na vida de Ema que a levam a ter determinada atitude naquele momento. Já tinha conhecido o homem X? As filhas já tinham nascido? Que idade tinham? Que idade tem Ema? Neste livro, salvo raras excepções, como breves referências aos cabelos brancos e às rugas, Ema não tem idade. É impossível saber quanto tempo passou desde que a conhecemos, ainda criança até ao dia em que morre.

A acreditar no que vem na parte detrás do livro, que este terá sido escrito para servir de guião ao filme homónimo de Manuel de Oliveira, aceito este livro como algo mais afastado do universo da autora. Quero acreditar que os outros livros dela é que contam para a aclamação de que é alvo. Por isto, e porque encontrei algum encanto na escrita da Agustina Bessa-Luís, a minha vontade de ler a Sibila continua intacta. ;)

Deste Vale Abraão não gostei. Eu tentei, mas não gostei e, por isso não recomendo. :)

julho 22, 2010

Cinco Quartos de Laranja - Joanne Harris

"Framboise regressa à pequena cidade onde nasceu, na província francesa, e abre aí um restaurante que rapidamente se torna famoso, graças às receitas de um velho caderno que pertencera à sua mãe. Essa espécie de diário contém igualmente uns estranhos apontamentos cuja decifração lançará uma nova luz sobre os dramáticos acontecimentos que marcaram a infância da protagonista nos dias já longínquos da ocupação nazi. Framboise recorda os sabores e os sentimentos da sua infância, numa França marcada pela dor e pela penúria da guerra, e muito especialmente um episódio que marcou a vida da família e constituiu, para ela, a perda definitiva da inocência. Agora, já no Outono da vida, chegou a hora de enfrentar a difícil verdade."

Já disse aqui que a Joanne Harris é uma das minhas escritoras favoritas. Aguardo sempre com alguma ansiedade os livros que escreve e é das poucas que compro sem qualquer hesitação, qualquer que seja o preço marcado. :) Não é um escritora unânime, eu própria tenho livros dos quais gosto menos e não a considero perfeita. Mas há algo nos livros desta escritora que tenho dificuldade em expressar por palavras mas que me encanta. Os seus livros são difíceis de rotular, ela escreve romances, considerados mais femininos, é verdade, mas como são normalmente tão pouco ortodoxos e livres de regras e de pudores é complicado colocá-la na mesma prateleira que a Sveva Casati Modignani, Nora Roberts ou outras. Falam de amor, mas às vezes é um amor tão retorcido que não sei se serão livros assim tão românticos. Os livros têm todos algo de fantástico e até algum horror, mas não são de todo livros de fantasia e de terror. Falam de factos históricos, mas a intenção também não é dar lições de história. A dificuldade em classificar os livros da Joanne Harris está na originalidade das suas histórias e na genialidade da sua escrita. Percebo que nem todos gostem. Eu gosto! :)

O Cinco Quartos de Laranja é, de todos os que já li dela , aquele que mais me encheu as medidas. Este narra a história de Framboise e da sua família, em Les Laveuses, uma pequena aldeia francesa, durante a ocupação da França pela Alemanha. Framboise é a mais nova de três irmãos, Cassis e Reine-Claude. Vivem os três com a mãe, Mirabelle Dartigen. O pai de Framboise morreu na guerra, morto na frente quando defendia as fronteiras de França contra as investidas da Alemanha nazi.
Os Dartigen não são uma família normal, a mãe é uma mulher torturada, amarga, seca como uma ameixa, rígida e, aparentemente, incapaz de amar. É acometida por dores de cabeça tão fortes que a deixam violenta e irascível e, depois prostrada na cama. Essas dores de cabeça são sempre precedidas pelo cheiro de laranjas, que só ela consegue sentir. Este é um fruto completamente proibido em casa. Mirabelle é desequilibrada e instável, receia a qualquer momento ficar louca. Demonstra o seu amor pelos filhos através da culinária, cozinhando autênticos festins que serve de cara fechada, mas no qual colocou todo o seu afecto.
As crianças crescem sem carinho, cheios de regras e de deveres, mas sem amor, sedentas de atenção. Aprendem a temer a mãe e evitar os seus ataques. São pequenos selvagens e por isso, facilmente seduzidos por Tomas Leibnitz, um alemão de falinhas mansas e olhos doces que os começa a usar como informadores no seu negócio de mercado negro.
Framboise tem 9 anos e é um criança corajosa, inconsequente, teimosa, inteligente mas, acima de tudo é carente. Sente um abandono tão grande dentro de si que o alemão de voz doce, com os seus sorrisos e os seus presentes a deixam num estado de adoração perigoso. Por ele e para o agradar, Framboise é capaz de tudo.
Demasiado parecida com a mãe, tem por ela um ódio inimaginável, vivendo as duas num desafio constante. Framboise é o catalisador de toda a história. Na inocência e na crueldade dos seus 9 anos, ela é responsável pelo desenrolar dos acontecimentos trágicos que acabaram em mortes e na fuga dos Dartigen para longe de Les Laveuses.
Anos mais tarde, Framboise volta a Les Laveuses como a veuve Simon, e a ninguém revela a sua verdadeira identidade. Receia que o nome Dartigen ainda seja capaz de despertar ódios antigos na pequena comunidade. Framboise tornou-se uma mulher determinada, intolerante e por vezes fria. Não quer desafiar ninguém, apenas regressou à velha quinta da mãe, onde pretendia acabar os seus dias em paz. Nem tudo lhe corre como esperado e ela será obrigada a reviver os horrores da infância. É, aliás ela quem nos conta a história, doída pela culpa que sente e triste por não ter tido a capacidade de entender a mãe, que não era só aquilo que aparentava.

Eu gosto muito deste livro. Adoro as personagens, principalmente a Framboise, que nos arrepia por ser tão cruel, mas que temos dificuldade em odiar, por ser uma criança, mas principalmente porque é uma criança amargurada e mal amada e a mãe Mirabelle que é tão atormentada, por algo que não sabemos, com aquelas enxaquecas que a deixam quase louca. Incapaz de demonstrar o amor que sente pelos filhos, e que se revela no livro de receitas, onde no meio das receitas foi escrevendo uma espécie de diário, que deixou a Framboise quando morreu.
Não é uma história bonita, está cheia de rancores e de sentimentos obscuros, associados a crianças o que torna a coisa ainda mais perturbadora. Não sei se a posso considerar uma história de amor, o que é de certeza é uma história sobre actos e consequências. Tudo o que fazemos tem uma reacção e nem sempre é possível controlar a reacção, especialmente se estivermos em tempo de guerra e numa aldeia de província ocupada pelas tropas invasoras. Especialmente se formos uma criança mal-amada e que se comporta quase como um cachorrinho ao menor gesto de carinho e afeição.

Leiam! :)

Nota: O próximo livro de Joanne Harris O Rapaz de Olhos Azuis, será editado em Portugal, pela ASA, lá para Setembro. Segundo a agenda da autora, ela estará em Portugal entre 14 e 19 Setembro para o apresentar. Mais notícias, em português, sobre a autora estão neste blogue que descobri há pouco tempo: http://joanneharris.blogs.sapo.pt/.

julho 18, 2010

O Homem do Colorado - Stephen King

"Numa ilha ao largo da costa do Maine é encontrado o cadáver de um homem não identificado. Só o trabalho empenhado de dois jornalistas locais e de um aluno de pós-graduação em medicina forense permite apurar algumas pistas, embora se passe mais de um ano até o homem ser identificado. Mas isto é apenas o princípio do mistério. Porque quanto mais sabem acerca do homem e das circunstâncias enigmáticas da sua morte, menos a compreendem. Qual teria sido o móbil do crime?

Ninguém como Stephen King poderia contar esta história acerca da aura que rodeia o desconhecido e da nossa compulsão para investigar o inexplicável. Com ecos de Dashiell Hammett e Graham Greene, um dos maiores contadores de histórias do mundo presenteia-nos com uma narrativa emotiva e surpreendente cujo tema é nada menos do que a própria natureza do mistério..."

Dois adolescentes fazem o seu percurso diário para a escola quando encontram um homem morto, junto à água. Estamos na ilha Moose-Lookit, no estado do Maine e o homem é um forasteiro, não possui qualquer tipo de identificação e ninguém se recorda de o ter visto nos dias anteriores. Uma vez que a causa da morte terá sido asfixia, consequência de o desconhecido se ter engasgado com um pedaço de carne, as autoridades não se dedicam muito ao caso. Apenas dois jornalistas, Dave Bowie e Vince Teague, permanecem interessados na identificação do cadáver e nos porquês de este estar ali, sem carteira e sem justificação aparente para se encontrar na ilha. Dave Bowie é o director-geral do The Weekly Islander e Vince Teague é o seu único repórter e funcionário. Para além deles, apenas um estagiário de medicina forense, Paul Devane se mantém interessado no caso, sendo ele quem acaba por permitir a identificação do forasteiro, um ano e meio mais tarde.
Vinte cinco anos depois, Dave e Vince, já com uma idade avançada, contam a história do Homem do Colorado, pois foi desta forma que o desconhecido foi tratado até à sua identificação final, a Stephanie, a estagiária que acolhem na redacção do jornal local.

O livro é muito divertido, porque os dois velhotes são muito espirituosos e, é muito interessante porque fornece uma abordagem à génese do mistério e ao porquê de a opinião pública se interessar por uns casos e outros não. Vai-nos descrevendo a investigação dos dois e todos os raciocínios que fizeram, as opiniões que formaram e as conclusões a que chegaram, se é que chegaram a alguma, porque o Homem do Colorado acabou por ser identificado, mas nunca ninguém descobriu o que estava ele ali a fazer. Terá sido realmente um acidente ou o homicídio poderá ser uma hipótese? Porque estava aquele homem ali, longe de casa e sem carteira? Veio de livre vontade? Estava a fugir de alguma coisa ou de alguém? Foi apenas desanuviar, pensar na vida? Estas e muitas outras questões são levantadas e nenhuma delas tem resposta. Se tivessem deixava de ser um mistério, não era? ;)

Já li este livro do Stephen King há algum tempo. A razão para falar dele agora é porque estreou uma série intitulada Haven, baseada neste livro. Já vi o primeiro episódio e, posso dizer que tem muito pouco a ver com o livro. É estranho que tenham decidido fazer uma série, que inclui fenómenos paranormais e pessoas aparentemente amaldiçoadas, baseada no, provavelmente, único livro do Stephen King que não inclui nada dessas coisas... As adaptações cinematográficas das obras do Stephen King sempre foram para mim um mistério de tão más que conseguem ser. As excepções, de que me consigo lembrar são o The Green Mile (chorei baba e ranho), The Shawshank Redemption (5 estrelas) e o The Fog (baseado num conto também muito bom). As restantes são tão más que doem...
Bem, quanto à série, fora o pormenor de ter pouco ou nada a ver com o livro, não me parece nada de especial, mas vou ver mais um ou dois episódios para ver o que vai sair dali... :)

Este livro do Stephen King é pequenino, quase um conto a dar para o grande e, não inclui entidades do outro mundo, extraterrestres, mortes macabras e aterradoras, nem inclui escritores a passarem por bloqueios de criatividade. :) Embora não tenha nada disto, o livro é muito engraçado e acho que vale a pena ler.

Boas leituras!

julho 15, 2010

[ebook] Dom Casmurro - Machado de Assis

Não vou colocar sinopse porque as que estão nas diversas edições deste livro são escandalosamente reveladoras da história. Tamanha indiscrição, não matando a história tira-lhe parte do encanto. Feito o esclarecimento, passemos ao livro.

Dom Casmurro é a a alcunha que Bentinho Santiago recebe de um desconhecido e que é adoptada de imediato pelos seus conhecidos, por ser introspectivo e solitário. Bentinho, filho único de Dona Glória, estava destinado à vida eclesiástica. Seria padre porque a mãe assim o tinha prometido aquando do seu nascimento, como reconhecimento a Deus por finalmente conseguir levar uma gravidez a bom termo. Bentinho cresce mimado pela mãe, que o venera e protege de tudo. Com eles viviam também o Tio Cosme, irmão da mãe, a Prima Justina e João Dias, amigo e conselheiro da família. Bentinho é uma criança de imaginação fértil, mimado por todos que se torna num adulto de certa forma infantil e pouco determinado.
Capitu, vizinha dos Santiago, era a única companheira de brincadeiras de Bentinho. Cresceram juntos, inseparáveis nas suas brincadeiras. Até ao dia em que Bentinho vê aproximar-se o dia em que terá de entrar no seminário e assim cumprir a promessa que a mãe fez. Bentinho não deseja ser padre, não sente vocação, muito menos agora que descobriu sentir por Capitu mais do que amizade. Descobriu-se a encontrar nela encantos antes inexistentes. Ama-a, do alto dos seus 15 anos, com a intensidade do primeiro amor que, ainda por cima, é correspondido. Obediente e submisso à mãe, aflige-se por não saber como fugir a este destino sem desgostar a mãe, que venera e ama incondicionalmente. O que acontecerá a Bentinho e Capitu? Ficarão juntos ou Bentinho acabará a presidir ao casamento de Capitu com outro homem e a baptizar o seu primeiro filho? A estas questões não dou resposta, terão de ler, porque não me atrevo a contar mais nada. Gostei da expectativa e apreensão que senti enquanto lia o livro e por isso não vos vou roubar esse gostinho. :) Só vos posso dizer que o final vale bem cada minuto gasto na leitura deste livro surpreendente. :) E quanto à história fico-me por aqui, acrescentando apenas que a história é narrada pelo próprio Bentinho, muito mais velho e a viver numa casa igualzinha à casa da sua infância. Estará Capitu com ele? Leiam e logo verão! :)

Primeira palavra que me ocorre quando li as últimas palavras foi: Adorei! Gostei da escrita, gostei da história e da forma como ela é contada, gostei das personagens, sobre as quais nunca temos certezas pois são, na narração que Bentinho faz, inocentes e puras mas com um ou outro pormenor que as torna de repente ambíguas, com segundas intenções. Gostei, especialmente da contemporaneidade que encontrei na escrita. Esperava encontrar os floreados típicos do século XIX mas, ou no Brasil a tendência não era a mesma ou Machado de Assis foi pioneiro. A escrita é fluída, limpa e muito eficaz na mensagem que pretende passar. Se não soubesse que estava a ler uma obra publicada nos finais do século XIX, em 1899, não ficaria surpreendida se descobrisse ter sido escrita o ano passado. :) Este é daqueles que vou querer ter na minha estante para poder reler um dia.

Gostei muito e recomendo!

Nota: Existe um filme baseado na história do livro de Machado de Assis, chama-se "Dom" (trailer aqui) e é realizado por Moacyr Goés. Pelo trailer, sinceramente não me parece lá grande coisa... Existe ainda uma minisérie, "Capitu" (trailers aqui), produzida pela Globo, que me parece mais fiel ao livro.

julho 13, 2010

A Bruxa de Monte Córdova - Camilo Castelo Branco

"Editada em 1867, esta obra cedo se tornou objecto da atenção crítica de Camilo. Embora tendo alcançado ao tempo um menor êxito comercial que outros títulos romanescos — realidade que Camilo adopta para um exercício irónico sobre os merecimentos das novelas — a verdade que «A Bruxa de Monte Córdova» deve ser "encarada como texto paradigmático do universo ficcional de Camilo e da mundividência que o enforma", permitindo "trilhar caminhos susceptíveis de conduzir ao âmago desse universo" e perceber que "em Camilo as histórias de amor nunca são apenas histórias de amor. São também preciosos testemunhos da organização sócio-económica de um tempo e de um lugar em que matrimónio e património eram faces de uma mesma e única moeda." (sinopse daqui)

Depois de ter lido o livro de Anton Tchekov, A Minha Mulher (a minha opinião aqui), que me soube a tão pouco por ser pequeno, fiquei com o bichinho do século XIX e fui à estante ver quem seria o feliz contemplado, se o Eça se o Camilo. Ganhou o Camilo, até porque do Eça já li quase tudo o que tenho aqui em casa. :)
Já não lia Camilo Castelo Branco há uns bons aninhos e quando comecei a ler este A Bruxa de Monte Córdova, senti alguma estranheza e desconforto com a linguagem. Confesso que fiquei um pouco assustada porque sempre me tive como uma pessoa que gostava de Camilo Castelo Branco. Insisti na leitura e, em boa hora o fiz, porque acabei por encontrar o ritmo da narrativa e o livro revelou-se bem interessante, onde reencontrei o escritor e as suas histórias dramáticas e ao mesmo tempo divertidas, devido à ironia que está presente em muitos dos diálogos.

Tendo como pano de fundo a Guerra Civil Portuguesa, que ocorreu entre 1831 e 1834, e opôs os defensores de D. Pedro I e da sua filha D. Maria II, liberais e constitucionalistas, aos defensores de D. Miguel I, os absolutistas e tradicionalistas, A Bruxa de Monte Córdova relata-nos a história de amor entre Tomás de Aquino e Angélica Florinda. Esta é uma história trágica para cujo desfecho muito contribuiu a época conturbada em que se vivia, mas principalmente a falta de carácter dos representantes de Deus na terra, que incentivavam o fanatismo e o histerismo religiosos.
A partir daqui é só spoilers!!!!!!!
Tomás de Aquino, segundo filho de uma família de fidalgos, está, desde que nasceu destinado à vida religiosa. Tomás entra para o Convento de Tibães contra a sua vontade mas, respeitando a vontade do pai torna-se um frade beneditino. Ao entrar para o convento encontra tudo menos Deus, os companheiros são mesquinhos, cruéis e muito pouco cristãos. Tomás sofre com a separação de Angélica e não encontrando consolo em Deus, foge. Não procura Angélica porque, sendo um frade não poderá casar com ela. Alista-se, então no exército de D. Maria II e luta corajosamente pela causa liberal, tendo a esperança de que os seus votos um dia sejam anulados junto de Roma.
Quando Tomás entra para o convento, Angélica é uma rapariga de 17 anos, a mais formosa da aldeia, a quem todos cortejam. No entanto, ela encontra-se prometida, desde os 12 anos (?!), a um tio (?!?!?!) brasileiro e rico que por ela se encantou e que a virá desposar quando ela completar 19 anos. No dia em que o tio chega, Angélica foge e abriga-se no Convento de Santa Clara, onde mais tarde, Tomás a reencontra. Renasce o amor entre os dois e decidem viver juntos, mesmo que em pecado, enquanto Tomás luta pelos liberais.
Quando Tomás morre na Batalha do Cabo de São Vicente, Angélica entra novamente para o Convento de Santa Clara e entrega o filho de ambos aos cuidados de Frei Jacinto de Deus, um dos facilitadores da fuga de Tomás do Convento de Tibiães e um dos seus maiores amigos.
No convento Angélica, guiada espiritualmente por Frei Silvestre, é acometida por culpas e fervores religiosos que a tornam louca e histérica. Culpa-se pela morte de Tomás pois foi ela quem o desviou do caminho religioso, vivendo com ele em pecado e tendo um filho fora do matrimónio. Este Frei Silvestre é uma criatura sinistra, um charlatão de falinhas mansas que ganha a vida a vender supostas relíquias religiosas: tinha distribuído no país tal porção de falanges dos dedos de S. Bono presbítero e mártir, que preciso fora ter o santo mais braços que Briareu, para que todos os ossos fossem dele. Frei silvestre, o fradinho do arrábido, incentiva a expiação de Angélica, pois só o sofrimento poderá salvar Tomás das chamas do Inferno e proíbe-a de ver o filho.
Frei Jacinto de Deus cuida da criança até morrer e, depois de muitas voltas e contratempos o filho de Tomás e Angélica acaba Conde de Burgães, depois de uma passagem bem sucedida pelo Brasil. É um homem bem formado e justo, ciente das suas origens e orgulhoso delas. Acaba por reencontrar a mãe, agora conhecida como a bruxa de Monte Córdova, nome que lhe veio de anos de peregrinação e penitência onde granjeou a fama de exorcista. Exorcista sim, mas das almas doentes de amor, dos amores proibidos pelos pais e pela sociedade. Angélica curava as doenças de amor, aconselhando os pais a deixarem as suas filhas casarem com quem desejavam e não com velhos babões, tios e afins. ;)
O livro acaba com Angélica a morrer nos braços do filho depois de este lhe dizer que a perdoa por tudo. :)
Acabaram os spoilers! :)

Depois da dificuldade inicial em entrar na história, acabei por gostar deste livro. Gostei principalmente da envolvente histórica e da caracterização da sociedade e do pensamento das pessoas que o escritor faz ao longo do livro. A história em si, é Camilo, sem tirar nem pôr, (embora aqui ninguém morra tuberculoso e de amor :p) e destaco as personagens que ele criou para este livro, especialmente o Tomás de Aquino e o Frei Jacinto de Deus. A conversa que este tem com o Frei Silvestre, o frade charlatão, é do melhor que há. :)

Para quem gosta do género, recomendo. Para uma primeira leitura de Camilo Castelo Branco, aconselho outros livros dele. Talvez os mais conhecidos como o Amor de Perdição, Queda de Um Anjo e por aí fora. :)

Boas leituras!

julho 12, 2010

[ebook] Through The Looking Glass, And What Alice Found There - Lewis Carroll

"Continuing Alice's adventures, this book sees her walking through a mirror into a topsy-turvy world. There she meets a host of bizarre characters, including Tweedledum and Tweedledee, Humpty Dumpty and the Red Queen. But is it all a dream?"

Through The Looking Glass, And What Alice Found There, escrito em 1871, é a sequela do Alice's Adventures in Wonderland (a minha opinião aqui), publicado em 1864. Seis meses depois de Alice ter entrado pela toca do coelho, e ter ido parar ao País das Maravilhas, ela atravessa o espelho e vê-se no Pais do Outro Lado do Espelho.




A curiosidade de Alice leva-a a atravessar o espelho para saber como será a vida do outro lado. Do outro lado do espelho, onde a vida é invertida, ela torna a encontrar personagens, no mínimo caricatas e embarca numa espécie de jogo de xadrez vivo, com saltos no tempo e no espaço, e conversas surreais e divertidas.

Fala com um bando de flores pretensiosas e com insectos que são estranhos, um deles uma borboleta cujas asas são torradas e a cabeça é um torrão de açúcar. Conhece a Rainha e o Rei Vermelhos e a Rainha e Rei Brancos, peças de xadrez. Cruza-se com os famosos Tweedledum e Tweedledee os dois irmãos que nunca se contradizem um ao outro e, o mais que famoso Humpty Dumpty, o ovo nada simpático em cima de um muro, que faz a cabeça da pobre Alice em papas com tantas perguntas e admoestações... :)

Tendo lido os dois, posso dizer que gostei mais do Alice's Adventures in Wonderland. Porque foi o primeiro a ser lido e por isso a minha surpresa em relação à originalidade da história e à personalidade da Alice foi maior. Também gostei mais da história e dos diálogos.
Neste Through The Looking Glass, And What Alice Found There, acho que as personagens são mais criativas e a Alice continua toda senhora de si, o que é bom, mas a história é mais difícil de acompanhar e por isso acaba por ser menos divertida. Se em relação ao primeiro acho que as crianças já têm alguma dificuldade em compreender tudo, neste isso é ainda mais notório. Mas gostei e recomendo!

Boas leituras! :)

julho 11, 2010

A Cidade dos Ossos - Cassandra Clare

"No Pandemonium, a discoteca da moda de Nova Iorque, Clary segue um rapaz muito giro de cabelo azul até que assiste à sua morte às mãos de três jovens cobertos de estranhas tatuagens. Desde essa noite, o seu destino une-se ao dos três Caçadores de Sombras e, sobretudo, ao de Jace, um rapaz com cara de anjo mas com tendência para agir como um idiota..."

Parece que ando virada para os livros de fantasia... Este fui "roubá-lo" à estante do meu irmão atraída pela capa brilhante (quem diz que os olhos não comem não sabe do que fala...) e não pela sinopse, que parece escrita por uma adolescente de hormonas aos saltos. Felizmente o livro, embora claramente dirigido a um público mais juvenil, não está cheio de rapazes muito giros, com cara de anjo mas que agem como idiotas. :p Os adolescentes que fazem esta história são até espirituosos e com sentido de humor. Têm todos uma personalidade que não me fez comichões, são miúdos normais e não daqueles que me fazem revirar os olhos. :)

Clary tem 15 anos e vive com a mãe, Jocelyn. O pai terá morrido num acidente de automóvel quando Clary ainda não tinha nascido. Uma noite, sem que nada o fizesse prever, Clary dá de caras com três jovens, cobertos de tatuagens estranhas e que se preparam para matar o tal rapaz "muito giro de cabelo azul" da sinopse. Ele acaba mesmo por morrer, mas o que Clary descobre é que este não era um rapaz, mas sim um demónio e que os três adolescentes, que aparentemente só ela consegue ver, são Caçadores de Sombras.
Dias depois a mãe de Clary desaparece e o apartamento onde Clary vivia com a mãe está repleto de criaturas repugnantes a que Jace, um dos Caçadores de Sombras, chama de Abandonados. Clary é salva por Jace e levada para o Instituto, sítio onde os Caçadores de Sombras procuram abrigo. Aqui, Clary descobre que a sua mãe é uma Caçadora de Sombras foragida e que ela própria pertence a esta elite. A partir daqui a vida de Clary muda e ela tudo fará para descobrir a verdade e salvar a mãe das garras de um Caçador de Sombras sem escrúpulos, Valentim que não olha meios para atingir os fins.
Basicamente é isto, com muitas revelações inesperadas (ou nem tanto assim), segredos de família e relações inimagináveis (ou nem tanto assim) e traições à mistura. Pelo meio existe o desenvolver da relação de Clary com Jace, que é engraçada porque Cassandra Clare a conseguiu explorar de uma forma menos comum, sem os olhares lânguidos e suspiros pelos cantos. :) O desenvolvimento das personagens é para mim o ponto forte deste livro, porque a história em si é demasiado juvenil, para o meu gosto pessoal.

O livro fez-me pensar no Harry Potter em quase todas as páginas. As semelhanças com a história do adolescente feiticeiro que não sabia sequer que existia magia porque foi criado por muggles são muitas. Em A Cidade dos Ossos, temos Clary, uma miúda de 15 anos que de um dia para o outro, descobre que pertence a uma espécie de humanos especiais, os Caçadores de Sombras, meio anjos meio humanos, criados para combater demónios e proteger os humanos vulgares, a que chamam mundis. E as semelhanças não ficam por aqui, para além desta descoberta comum, que lhes mudará as vidas para sempre, ambos descobrem um mundo de que nem desconfiavam, casas decrépitas aos olhos dos mundis são afinal edifícios perfeitamente habitáveis, protegidos por magia que as esconde do comum dos mortais, mensagens enviadas por pássaros, lobisomens, portais que nos transportam para onde queremos, poções mágicas e uma história familiar trágica.
Pessoalmente prefiro o mundo de fantasia de Harry Potter porque tenho dificuldade em achar credível (não que acredite no mundo criado por J. K. Rowling) que a minha vizinha do lado ande por aí a proteger-me de demónios, enquanto anda de metro e leva porrada sem que mais ninguém se aperceba do que se passa. Ao menos o de Harry Potter é manisfestamente um mundo inventado, criado pela autora e isso para mim é mais aliciante com leitora. No que à literatura fantástica diz respeito, sou mais do género As Brumas de Avalon, O Senhor dos Anéis (e se meter demasiados dragões e lutas épicas já me começo a enjoar :p), o próprio Harry Potter e até o mundo de Robin Hobb com a sua Saga do Assassino. Como nunca fui fã de livros de vampiros (a não ser que sejam bem maus, mais tradicionais portanto), lobisomens e criaturas humanas com poderes especiais, como super-heróis, este livro poderia ter sido um desastre para mim mas, a verdade é que não foi mau de todo. Como disse as personagens estão bem desenvolvidas, os diálogos são credíveis e acho que está bem escrito, sem ser genial e arrebatador, é um livro que cumpre.

Recomendo a quem gosta deste género de livros. Se gostaram do Harry Potter é bem provável que achem piada a estes, embora os do Harry Potter sejam mais ricos em termos de história, de cenários e até de personagens. É uma leitura agradável, que não feriu a minha sensibilidade literária (hoje estou "cheia de mim" :)), é o que me ocorre dizer em jeito de conclusão.

Boas leituras! :)

julho 08, 2010

A Minha Mulher - Anton Tchékhov

"É na narrativa breve que o autor russo melhor transmite, através de retratos subtis da vida quotidiana, a sua visão ao mesmo tempo sombria e apaixonada da humanidade, revelando um conhecimento íntimo da alma russa, com as suas qualidade e defeitos, tal como se poderá comprovar com A Minha Mulher. Neste livro, a partir do olhar excessivamente presumido e crítico de Pavel Anndreievitch, abastado ex-funcionário no Ministério das Comunicações, e da relação fria e tensa que este mantém com a sua mulher, somos transportados para a Rússia profunda e rural do século XIX, com todos os seus problemas e conflitos. Uma obra magnífica, na qual se pode respirar o sentimento de desalento e impotência da sociedade russa face ao infortúnio do povo."

Bem, este foi mais que rápido a ser lido. Outra coisa não seria de esperar, dado o reduzido número de páginas que o compõem. Primeiro livro de Anton Tchekov que leio e posso dizer que não fugiu ao que eu estava à espera: escrita, história e personagens típicas da literatura, russa e não só, do século XIX. Eu até gosto desta época literária, mas este livro é tão pequenino que soube-me a pouco.

Pavel Anndreievitch vive na sua casa de campo, com Natália Gavrilovna, sua mulher. Cada um vive numa parte da casa, vivendo separados há já uns anos. Natália não suporta Pavel, demonstrando-lhe um ódio que Pavel não consegue compreender. Pavel vive sozinho e angustiado sem que consiga descortinar uma única razão para o seu desconforto interior. Quando recebe uma carta anónima pedindo-lhe que faça algo pela população empobrecida de uma localidade vizinha, sente-se entusiasmado pela ideia e, formula planos para organizar uma comissão de solidariedade que angarie os fundos necessários à causa e os distribua de forma justa. Quando expõe a sua ideia à mulher, descobre que esta já estava à muito empenhada no auxílio desta população, tendo inclusivé a tal comissão já formada. Pavel interroga-se sobre as razões que a levaram a exclui-lo. Natália explica-lhe então porque o despreza tanto: ele é egoísta, pouco flexível, desconfiado e com um temperamento difícil, que o inibe de manter relações cordiais com as outras pessoas. Depois do choque, Pavel sofre uma espécie de epifania, confessando a si mesmo que nunca deixou de amar a mulher e que está disposto a tudo para a recuperar, inclusivé mudar a sua personalidade e abdicar de toda a sua fortuna. A partir do momento em que ele sai do seu casulo, da sua zona de segurança e expande os seus horizontes, olhando com a mente aberta para o mundo à sua volta, a partir do momento em que deixa de julgar e criticar sem conhecer, essa mudança ocorre e Pavel torna-se numa melhor pessoa.

Basicamente o livro é isto, e tendo em conta o tamanho do mesmo não seria justo dizer que é pouco. Conseguir, em poucas páginas, transmitir tudo isto de forma convincente é de aplaudir. Mas sou uma confessa adepta de livros grandes, o que não me impediu de gostar deste pequeno grande livro do Tchekov, mas quando a pessoa já está embalada e a criar empatia com as personagens, o livro acaba. Isso deixa-me sempre um pouco frustrada.

Vou querer ler mais livros deste senhor, mas vou tentar que sejam colectâneas de textos, livros de contos ou romances maiores, porque assim sabe-me a muito pouco. :)

Boas leituras!

Nota: Porque é que é tão difícil chegarem a um consenso quanto à forma como se escrevem os nomes dos autores russos?! É assim tão difícil adoptarem todos a mesma grafia?! Credo que irritação isto me provoca... Tchekov ou Tchekhov ou ainda Chekhov? O mesmo se passa com o Tolstoi, ou será Tolstoy? E é Leon, Leo ou Liev? Mania parva de traduzirem nomes...

julho 07, 2010

Quantas Madrugadas Tem a Noite - Ondjaki

"Quantas Madrugadas Tem a Noite está destinado a ser um marco na literatura angolana e na literatura de língua portuguesa em geral. Com uma extraordinária mestria narrativa, Ondjaki conta aqui uma história em que não se sabe o que admirar mais, se a fulgurante imaginação do autor, se a sua capacidade para a criação de tipos e situações carregados de significado, se a sua capacidade para elevar a linguagem coloquial a um altíssimo nível literário. O humor, a farsa, o lirismo, a tragédia, o horror, todos estes sentimentos são aqui convocados e expostos, com a fluência de quem conta, simplesmente uma história, na Luanda dos dias de hoje."

Foi por causa do nome que comecei a olhar para os livros deste escritor angolano, Ondjaki, tem uma sonoridade exótica, que me transporta para sítios desconhecidos, cheios de cor, música e aromas fortes. Não faço ideia o que quer dizer Ondjaki e porque é que o jovem (surpreendentemente jovem) escritor angolano, Nadlu de Almeida o escolheu para seu pseudónimo literário, o que sei é que gosto do nome e, agora que li o que escreve, também gosto do escritor. :)

Quantas Madrugadas Tem a Noite não é um livro fácil de ler. Apercebi-me enquanto o lia que o contacto que tive com a literatura lusófona e africana, basicamente Pepetela, Mia Couto e José Eduardo Agualusa, não me preparou para esta escrita tão intrinsecamente africana. Durante todo o livro vi-me forçada a consultar o glossário presente no fim do livro para perceber o que todas aquelas palavras significavam. Para além desses termos angolanos, que estão presentes em todo o livro, este está escrito numa linguagem muito oral, muito coloquial, propositadamente com erros ortográficos e gramaticais, o que torna a leitura, no inicio, um pouco difícil. No entanto, à medida que vamos entrando na história, a linguagem deixa de incomodar e conseguimos apreciar a beleza das palavras e das ideias. A beleza do mundo fantástico para onde Ondjaki nos leva e onde nos apresenta os protagonistas improváveis e caricatos desta história. Temos anão BurkinaFaçam, um homem de bom coração que vive dos típicos esquemas, sempre rodeado por duas prostitutas, Eva e Madalena. Temos o Jaí, um albino que é professor por vocação, honesto até à raiz dos seus cabelos amarelos. Temos Adolfodido (assim mesmo como está escrito), antigo combatente sem idade para combater, cuja morte põe o país em polvorosa, uma vez que, não se consegue decidir quem irá ser a primeira viúva do estado, se DonaDivina (ex-mulher) ou KiBebucha (actual companheira). Adolfodido nem na morte deixa de fazer jus ao nome de fodido. :) Temos a KotaDasAbelhas, que matou a abelha rainha e foi promovida a rainha da colmeia, comandando as abelhas no fabrico do melhor mel que já se provou. Com ela vive um cão, perdão, com ela vive O Cão. Um ser assustadoramente grande, que ocupa a melhor divisão da casa e que a KotaDasAbelhas serve. Todos o temem e ninguém sabe que criatura é e de onde veio, talvez do Inferno? Não sei. :)
Em troca de birras (cervejas) um homem, com uma sede que parece infinita, num qualquer bar de Luanda, conta esta história a um outro homem, pela noite fora até surgirem os primeiros sinais da madrugada: Num tenho dinheiro, num vale a pena te baldar. Mas, epá, vamos só desequilibrar umas birras; sentas aí, nas calmas, eu te pago em estória, isso mesmo, uma pura estória daquelas com peso de antigamente, nada de invencionices de baixa categoria, estorietas, coisas dos artistas: pura verdade, só acontecimentos factuais mesmo.

Não sei como são os outros livros de Ondjaki, mas sobre este só tenho coisas boas para dizer: é divertido, cheio de passagens inspiradas e inspiradoras e está muito bem escrito, ou melhor, a história está muito bem contada. Parece-me que ele consegue prender muito bem nas palavras o espírito luandense e é inevitável ficar rendida a toda a mística, que aparentemente só os escritores africanos parecem conseguir passar para o papel. Gostei muito e recomendo. :)

julho 04, 2010

Aprendiz de Assassino (A Saga do Assassino - Vol.I) - Robin Hobb

"O jovem Fitz é filho bastardo do nobre Príncipe Cavalaria e cresce na corte do Rei Sagaz. Marginalizado por todos, o rapaz refugia-se nos estábulos reais, mas cedo o seu sangue revela o Talento mágico e, por ordens do rei, é secretamente iniciado nas temidas artes do assassino. Quando salteadores bárbaros atacam as costas, Fitz enfrenta a sua primeira e perigosa missão que o lançará num ninho de intrigas. E embora alguns o encarem como uma ameaça ao trono, talvez ele seja a chave para a sobrevivência do reino. Com uma narrativa povoada de encantamentos, heroísmo e desonra, paixão e aventura, o Aprendiz de Assassino inicia uma das séries mais bem-amadas da fantasia épica."

Gostei deste livro. Não traz nada de muito novo à literatura fantástica, mas está muito bem escrito, com uma escrita muito fluída e acessível, e a personagem principal, o Fitz, o aprendiz de assassino, está muito bem conseguida. Refiro o Fitz porque foi aquela que mais me disse, mas todas as personagens deste livro têm méritos próprios e são todas muito boas. Esse é um dos pontos mais positivos do livro.
Faz-me lembrar um pouco o Harry Potter, não só pela magia envolvida, mas essencialmente porque é claramente um livro para os mais jovens que é facilmente lido e apreciado pelos já não tão jovens. ;)

Acrescentar o que quer que seja à sinopse seria contar a revelar partes da história e não vejo qualquer utilidade nisso, até porque é uma história que se lê muito bem e de forma muito suave, como se estivéssemos a ser embalados, por estranho que possa parecer. Todo o livro está escrito no mesmo tom calmo e sereno, independentemente do que se esteja a relatar. À primeira vista isto poderá parecer mau, mas a verdade é que neste caso resulta numa leitura muito prazeirosa, quase como se estivéssemos a ouvir a história contada pelo próprio Fitz, mas um Fitz mais velho, em paz com a sua vida e sem arrependimentos de espécie alguma. É uma variante interessante ao livros do género que normalmente são mais frenéticos e tensos o que, neste caso não fez assim tanta falta. :)
No entanto, por estar escrito desta forma, ficamos com a sensação que a história é parada e que nada acontece. O curioso é que isso não me fez poisar o livro, pelo contrário, li-o bem rápido e sempre com alguma relutância em pousá-lo. Eu sei que é um contrasenso, e a única explicação que me ocorre é que Robin Hobb só pode ser uma escritora muito habilidosa. :)

Resumindo, Aprendiz de Assassino é um livro que, individualmente tem o seu valor, no entanto é declaradamente um livro escrito a contar com os que lhe seguirão. A avaliação de toda a história do Fitz terá que ficar para quando ler o último volume da saga. :)

Boas leituras! ;)

julho 02, 2010

[ebook] Alice's Adventures in Wonderland - Lewis Carroll

"On an ordinary summer's afternoon, Alice tumbles down a hole and an extraordinary adventure begins. In a strange world with even stranger characters, she meets a rabbit with a pocket watch, joins a Mad Hatter's Tea Party, and plays croquet with the Queen! Lost in this fantasy land, Alice finds herself growing more and more curious by the minute."

E assim me vejo rendida ao Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll. Nunca o tinha lido ou sequer pensado ler, até que o livro voltou à baila por conta do filme de Tim Burton, Alice in Wonderland. Sendo agora uma tia babada, vou dando por mim a olhar para os livros de histórias infantis e a tomar nota mental daqueles que gostaria de ter à mão para quando as minhas sobrinhas tiverem idade suficiente para perceber o que lhes conto. Alice no País das Maravilhas passou a fazer parte dessa nota mental, mas sabendo de antemão que não era uma história apenas para crianças decidi dar-lhe uma vista de olhos primeiro. Em boa altura o fiz, porque o livro é muito divertido e a Alice é deliciosa. :)

Gostei muito do tom em que todo o livro está escrito, leve e divertido cheio de pormenores que ajudam a criar nas nossas cabeças o mundo maravilhoso onde Alice foi parar quando entrou na toca do coelho. O mais engraçado, é que mesmo sendo tudo tão irreal, não nos custa imaginar que poderia haver algo assim, quase como se todos nós, em crianças lá estivéssemos estado um dia, tal como Alice.
Gostei muito da Alice e não me lembro de a Alice da Disney, ou mesmo da série de desenhos animados (de que tenho vaga ideia), ser uma menina tão divertida e tão pouco convencional. Adorei que ela não fosse uma criança assustada, questionando tudo o que lhe contavam e que muitas vezes perdesse a paciência com toda aquela loucura e com todas aquelas criaturas surreais. É uma miúda engraçada... ;)

Gostei e, embora ache que as crianças não perceberão tudo o que está implícito no texto, acho que é natural que fiquem maravilhadas com as situações inesperadas e com as personagens bizarras. Foi-me fácil, enquanto lia, visualizar os olhinhos grandes e brilhantes das minhas sobrinhas maravilhadas com tanta fantasia! :p

Tendo lido uma versão ebook, confesso que senti falta das ilustrações, até porque algumas criaturas eram bem difíceis de visualizar, mas nada que uma pequena pesquisa na internet não resolvesse. :)

Só posso dizer isto: gostei tanto que já estou a ler o Through The Looking Glass, And What Alice Found There. ;)

Boas leituras!