"Ema bate-se contra a rede de pequenas e formidáveis misérias que se apertam em volta dela. Heroína provinciana das insatisfações típicas do ser humano, Ema conserva, ao morrer, a independência de espírito que fez a Margarida Navarra escrever nas suas Prisões: «Porque de [Deus] me tivesse dado carta branca / Para atravessar esta prancha mortal, / Eu não teria ousado pedir tantos bens / Quanto ele me deu, que todos tenho dele; / E dos seus dons e bens eu fiz mau uso.»
Ema usou de carta branca para atravessar a vida. É um crime? Uma loucura? Um ritual da tristeza? É, acima de tudo, um sentimento atávico que as mulheres cultivam e que está longe de servir a concupiscência. É o sentido de pertencer a um mundo melhor e para ele avançar mesmo à custa dos mais cruéis mal-entendidos."
Ema usou de carta branca para atravessar a vida. É um crime? Uma loucura? Um ritual da tristeza? É, acima de tudo, um sentimento atávico que as mulheres cultivam e que está longe de servir a concupiscência. É o sentido de pertencer a um mundo melhor e para ele avançar mesmo à custa dos mais cruéis mal-entendidos."
E à segunda vez que tento ler este livro consigo acabá-lo, não sem algum esforço e paciência. :) Fico sempre frustrada quando pego em autores, clássicos e acarinhados pelo público, como é o caso de Agustina Bessa-Luís e, não gosto do que leio. Deixa-me sempre uma sensação de não estar a perceber alguma coisa... Encontrei beleza nas palavras escritas e nalgumas ideias e descrições, que chegam a ser poéticas. Mas a sensação final foi de aborrecimento mortal. A história é chata, cheia de ideias confusas e repetitivas e a maneira como está escrita não me cativou nem um pouco. A parte inicial até se lê bem, mas a páginas tantas a história é difícil de seguir e o livro começa a ficar muito chato. Já só espero o momento em que Ema finalmente acabe com o seu (e meu) sofrimento e se suicide, porque achei que seria o fim mais provável para ela. Enganei-me, mas sinceramente nessa altura já não me interessava e já estava a a saltar parágrafos... :/
Esta é uma história de adultério, personalizado na Bovarinha portuguesa, Ema. A história passa-se nas margens do Douro vinhateiro, repleto de quintas bucólicas e em decadência, tal como a burguesia portuguesa. Atravessa a revolução dos cravos, com todas as mudanças sociais que daí resultaram, com a emancipação das mulheres e a crescente importância destas na sociedade portuguesa.
Ema é uma mulher insatisfeita, com desejos que ela própria tem dificuldade em definir. Dona de uma beleza estonteante, cedo começa a sentir por parte dos outros uma animosidade que, ao contrário de a surpreender, a faz sentir merecedora do desprezo. Os homens desprezam-na porque sentem na beleza dela algo de perigoso, têm medo do que não compreendem e desprezam-na. Ema procura ser amada, e vive num limbo entre querer um príncepe encantado que a tire da mediocridade, sustentando-a e tratando-a como um ser belo e digno de adoração e, o desejo que tem de ser independente e respeitada pelo que é e não pelo que esperam que ela seja. Quer um amor de conto de fadas mas, ao mesmo tempo tem um interesse pelos homens muito superficial. Casa-se com Carlos Paiva, um médico de província medíocre e sem verdadeiro talento. Carlos tem relativamente a Ema uma atitude de adoração e medo. Deseja-a e ama-a muito, mas não encontra nele habilidade para lidar com uma mulher como Ema. Passa então a fingir desprendimento e deixa-a a fazer tudo o que quer, com medo de a perder. Facilita-lhe os adultérios e finge não saber deles. Ema torna-se extravagante, com atitudes que provocam a maledicência do círculo restrito que forma a alta sociedade de Vale Abraão. Ainda antes de ter feito algo de moralmente reprovável já todos a tinham como adúltera e moralmente duvidosa.
No fundo esta uma história de uma mulher comum, que pensa poder ser especial e que luta contra a vulgaridade da vida e contra as rotinas impostas pela sociedade. No entanto ela própria, é incapaz de sair da mediocridade que também lhe é confortável. É uma mulher presa entre dois mundos e que vive saltando entres os dois, num frenesim que a esgota e oprime.
Dito desta forma, até parece interessante, e no início, como disse, até é. Depois torna-se nebuloso e cansativo. Em todas a páginas existem reflexões sobre o sexo, o prazer e o amor, feitas de uma forma confusa e repetitiva. A linha temporal do livro é muito difícil de seguir. A morte das personagens é anunciada, mas algumas páginas à frente lá estão elas em amena cavaqueira. É frustrante não conseguir discernir no meio de tanto andar para a frente e para trás, que coisas já aconteceram na vida de Ema que a levam a ter determinada atitude naquele momento. Já tinha conhecido o homem X? As filhas já tinham nascido? Que idade tinham? Que idade tem Ema? Neste livro, salvo raras excepções, como breves referências aos cabelos brancos e às rugas, Ema não tem idade. É impossível saber quanto tempo passou desde que a conhecemos, ainda criança até ao dia em que morre.
A acreditar no que vem na parte detrás do livro, que este terá sido escrito para servir de guião ao filme homónimo de Manuel de Oliveira, aceito este livro como algo mais afastado do universo da autora. Quero acreditar que os outros livros dela é que contam para a aclamação de que é alvo. Por isto, e porque encontrei algum encanto na escrita da Agustina Bessa-Luís, a minha vontade de ler a Sibila continua intacta. ;)
Deste Vale Abraão não gostei. Eu tentei, mas não gostei e, por isso não recomendo. :)