janeiro 23, 2011

Contos - Eça de Queirós (parte I)

Apercebi-me no outro dia de que nunca tinha lido este livro de Contos do Eça de Queirós. Tenho-o aqui em casa desde sempre, no entanto a minha menor inclinação para contos sempre adiou a sua leitura. Cheguei inclusive, a levá-lo para a escola, pois estudei nas aulas de português dois dos contos que fazem parte desta colectânea: A Aia e No Moinho. Nunca fui além disso e quando deixei de precisar dele para escola, voltou ao seu lugar nas estantes, entre A Cidade e as Serras e Prosas Bárbaras. Apercebi-me no outro dia que me apetecia ler Eça de Queirós e porque não um livro de contos?
Sendo os textos tão diversos um dos outros decidi que valia a pena falar de todos individualmente.

Ficam aqui os que li até agora.

O Réu Tadeu:
Tadeu Esteves é encontrado junto ao corpo de Simão. Simão é seu irmão e enforcou-se. Tadeu é preso pelo homicídio do irmão, e a única coisa que disse durante todo o julgamento foi que era culpado. Se é ou não culpado, não sabemos. Sendo um texto que está incompleto, o máximo que podemos fazer é, com a informação que os textos que Tadeu escreveu na cadeia, enquanto aguardava a execução da pena, morte por enforcamento, especular acerca do que realmente se passou. Tenho pena que este texto esteja incompleto pois deixou-me muito curiosa e gostei de o ler.

O Milhafre:
Eça de Queirós depois de dizer que "a literatura em Portugal está a agonizar", conta-nos uma fábula.
Numa casa arruinada havia um portal com um nicho onde um santo de pedra lia uma Bíblia de pedra, da qual não despegava os olhos. A excepção acontecia quando, à noite aparecia uma criança muito pobre que se deitava junto ao nicho. Aí, "o santo afastava um pouco o livro, e toda a noite ficava cobrindo com a grande luz dos seus olhos aquela criança miserável, adormecida sobre as lajes."
Na mesma casa arruinada, havia um crucifixo onde "sobre a cabeça e sobre os braços de Cristo havia teias de aranha: em baixo os ratos roíam-lhe a cruz." Um homem entra na casa arruinada e, compadecendo-se do estado em que se encontra o crucifixo prepara-se para limpá-lo, no entanto, o milhafre que lá se encontra pousado não deixa: "Deixa as aranhas, o pó, a caliça, os bichos, a neve, a geada, o apodrecimento. (...) Tudo o que ele criou, o amor, o ideal, o perdão, a fé, o pudor, a religião, Deus, todo aquele evangelho da vida nova, anda pelo mundo, tão degredado, tão coberto de bichos, tão imundo, como o seio desta imagem antiga."
Gostei muito deste conto, onde Eça de Queirós, pela voz do milhafre transparece alguma tristeza por o Homem ter morto a alma e o pensamento e cultivar o culto do corpo: "Oh, amigos íntimos dos vermes, como vós cuidais do corpo, e o laveis, e o amaciais, e o engordais - para a pastagem escura das covas."

O Senhor Diabo:
"O Diabo ao mesmo tempo tem uma tristeza imensa e doce. Tem talvez a nostalgia do Céu!" Assim é retratado o Senhor Diabo, uma criatura cuja existência não é a preto e branco, está antes cheia de todas as cores do arco-íris. Criatura que está mais perto do Homem que Deus.

Memórias de Uma Forca:
Neste conto conhecemos as memórias de uma forca, um carvalho que "desde pequeno fui triste e compassivo. (...) eu só queria o bem, o riso, a dilatação salutar das fibras e das almas." Um dia "um daqueles homens metálicos que fazem o tráfico da vegetação, veio arrancar-me à árvore". A Forca descreve a sua viagem angustiante até à cidade, sem saber que destino a aguardava. Quando percebeu que iria ser uma forca ficou "inerte, dissolvida na aflição (...) tinha enfim entrado na realidade pungente da vida. O meu Destino era matar."
Muito bonito este conto, escrito de uma forma que achei muito original.

A Morte de Jesus:
Mais um texto incompleto que não li todo. É o relato de Eliziel, capitão da polícia do Templo sobre a altura em que Jesus da Nazaré apareceu em Jerusalém e começou a ser conhecido como o Messias e Profeta. É um conto a dar para o comprido e o tema, demasiado religioso, com referências que não compreendo não me cativou.

Singularidades de Uma Rapariga Loura:
Um jovem pacato e reservado é um guarda-livros competente e responsável do armazém do seu tio. Um dia, numa janela do outro lado da rua, surge uma rapariga loura que prende a sua atenção e lhe rouba o coração. Apaixonado e cego de amor desvaloriza os pequenos incidentes que parecem ocorrer quando ela está por perto. Por causa dela, perde o emprego, vive na miséria, ganha algum dinheiro para o voltar a perder, recupera o emprego, pede-a em casamento e não casa com ela mas nunca a esquece. :) É uma boa história!

Mais dos Contos de Eça de Queirós nos próximos posts.

Boas leituras!

6 comentários:

  1. Apenas li o último porque encontrei um link para o conto completo (foi indicado por um bloguista) e estava curiosa por causa do filme. Gostei de como está contado, mas não da história porque não acaba bem.

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  2. redonda: Com Eça poucas histórias acabam bem. Não é lá grande fã do Viveram Felizes para Sempre. :)

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  3. Estou lendo estes contos e também estava louco para saber quem matou Simão.

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  4. Eu tenho quase a certeza que o unico livro que nunca esquecerei o final são os Maias... as ultimas linhas marcaram-me para sempre! Eça de Queiroz tem sempre sempre este efeito comigo faz -me sempre troçar de mim próprio e das nossas próprias fraquezas e contradições. Sei que em qualquer idade abrirei os Maias ou o Mandarim ou a Cidade e as Serras e identificarei-me com as personagens e com as situações e levarei sempre uma chapada de luva branca ns minhas convicções mais profundas! Realmente os contos nunca li, porque não gosto de contos por serem pequeninos e quando estou a começar já acabaram! Sim eu sei que já perdi muitos livros por causa disso, mas é dificil mudar de opinião!

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    1. Não sou fã de contos, mas estes do Eça de Queirós foram dos que me fizeram começar a mudar de opinião. Os contos não são uma excepção, existem bons e existem maus, como em tudo. Ainda por cima se gostas tanto de Eça, acho que deverias dar uma oportunidade aos contos. :)

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