Ano da edição original: 1881
Autor: Machado de Assis
Editora: Edições Cotovia (Biblioteca editores Independentes)
"Memórias Póstumas de Brás Cubas representa um marco decisivo tanto no desenvolvimento da obra do seu autor como na evolução da literatura brasileira. Rompendo com o estilo Romântico dos anteriores livros de Machado de Assis, é considerado o romance inaugural do Realismo brasileiro.
Publicado originalmente em folhetim, em 1880, na Revista Brasileira, saiu em livro em 1881, causando espanto à crítica da época: a obra era extremamente ousada do ponto de vista formal e apresentava as mais radicais experimentações na prosa brasileira até então, rompendo definitivamente com as fórmulas consagradas pelo Romantismo. Narrado por um defunto, o romance apresenta uma visão irónica do mundo e das pessoas, numa crítica mordaz à hipocrisia reinante. Livre e descomprometido com a sociedade, Brás Cubas, o narrador, revela e analisa não só os motivos secretos do seu próprio comportamento como também põe a nu as hipocrisias e vaidades das pessoas com quem conviveu. Um retrato da elite carioca do final do século XIX: uma burguesia rica com anseios de nobreza.
Fiel ao humor, à ironia e também à liberdade do texto machadiano, e antecipando procedimentos modernistas e descobertas da psicanálise, Memórias Póstumas de Brás Cubas elevou a literatura brasileira a um patamar que esta jamais havia atingido."
Foi com grandes expectativas que parti para a leitura deste livro, outra coisa não seria de esperar depois de ter lido o magnífico Dom Casmurro (já comentado aqui) e que adorei. Este Memórias Póstumas de Brás Cubas é bastante diferente do Dom Casmurro e, talvez por isso não tenha sido bem aquilo que eu esperava. Gostei do livro, acho que vale a pena lê-lo, mas também o achei por vezes aborrecido, sem que a vida do defunto Brás Cubas sofresse grandes desenvolvimentos. A verdade é que, no início, ou no fim, depende da perspectiva, achei que Brás Cubas iria ser uma personagem mais interessante. No início da narrativa pareceu-me que ele iria ser um bon-vivant do século XIX: rico, mulherengo e pouco preocupado com o que os outros pensam dele. Mas afinal Brás Cubas até era boa pessoa e de mulherengo tinha muito pouco, uma vez que, anda praticamente todo o livro com apenas uma mulher, Virgília, o seu único amor. Estava à espera de uma vida mais agitada e fechei o livro com a sensação de que a vida de Brás Cubas foi um bocadinho aborrecida e previsível...
A premissa é, no mínimo original, Brás Cubas decide escrever as suas memórias depois de morto, que a bem da verdade é quando elas fazem sentido e quando o autor terá mais tempo para se dedicar a esses afazeres. :) Brás Cubas foi, na infância, um pequeno terrorista que pregava partidas e fazia a vida dos criados e escravos num inferno. Protegido pelo pai que o adorava, foi crescendo no seio de uma família bem estruturada, feliz à sua maneira. Brás Cubas cresce, apaixona-se por uma espanhola que leva parte da fortuna do pai de Brás, parte para Portugal obrigado pelo pai, forma-se e regressa ao Brasil para estar junto da mãe que estava a morrer. Abalado com esta perda, parte para a Tijuca, para a propriedade da família, onde pretende restabelecer-se e pensar no que fará da sua vida no Brasil. Aí rouba o primeiro beijo da filha de uma das amigas da mãe, com quem não pensa casar, pois a rapariga é coxa, um defeito que não se coaduna nem com a beleza dela nem com o estatuto que Brás sonha para si: "Por que bonita, se coxa? por que coxa, se bonita?". A pedido do pai, regressa ao Rio, com o objectivo de ingressar na vida política e casar, pois político solteiro é algo que não cai bem na opinião da sociedade. A noiva que lhe está reservada é Virgília, uma rapariga de 16 anos, com quem Brás acaba por não casar, porque o pai desta decide patrocinar outro candidato a político, um mais bem preparado e posicionado, um que ambiciona tornar a sua filha Baronesa. Anos mais tarde, Virgília e Brás reencontram-se e o amor que não teve tempo de despertar no passado, arrebata-os desta vez. Tornam-se amantes e... é isto. O livro vai relatando a relação destes dois até ao dia, muitos anos depois, em que Brás Cubas está no seu leito às portas da morte.
Para além da história propriamente dita, está sempre presente uma crítica muito mordaz à sociedade carioca da época, o jogo das aparências e dos interesses, da importância que a opinião pública tinha na tomada de decisões relacionadas com a vida privada de cada um e de como o dinheiro compra quase tudo, inclusive a moral. Acredito que tenha sido uma pedrada no charco quando foi lançado. Tem passagens de humor deliciosas e que só por si valem a leitura do livro. :) Machado de Assis cria, na personagem de Quincas Borba, uma nova filosofia, o Humanitismo. Uma filosofia que professa a lei do mais forte, as guerras como selecção dos mais capacitados e afins. Alguns críticos indicam que esta terá sido a forma que Machado de Assis encontrou de ironizar a teoria da evolução de Darwin, contemporânea de Machado de Assis.
Está muitíssimo bem escrito, isso é inegável, foi a história central que achei fraca, com momentos em que senti vontade de saltar parágrafos. Recomendo porque é Machado de Assis e vale sempre a pena ler este autor, porque a escrita é do mais actual e divertido que existe.
Excerto:
" Não a vi partir; mas à hora marcada senti alguma cousa que não era dor nem prazer, uma cousa mista, alívio e saudade, tudo misturado, em iguais doses. Não se irrite o leitor com esta confissão. Eu bem sei que, para titilar-lhe os nervos da fantasia, devia padecer um grande desespero, derramar algumas lágrimas, e não almoçar. Seria romanesco; mas não seria biográfico. A realidade pura é que eu almocei, como nos demais dias, acudindo ao coração com as lembranças da minha aventura, e ao estômago com os acepipes de M. Prudhon..."
Boas leituras!
Fica aqui o trailer de uma das adaptações da obra para o cinema, Memórias Póstumas:
Fiel ao humor, à ironia e também à liberdade do texto machadiano, e antecipando procedimentos modernistas e descobertas da psicanálise, Memórias Póstumas de Brás Cubas elevou a literatura brasileira a um patamar que esta jamais havia atingido."
Foi com grandes expectativas que parti para a leitura deste livro, outra coisa não seria de esperar depois de ter lido o magnífico Dom Casmurro (já comentado aqui) e que adorei. Este Memórias Póstumas de Brás Cubas é bastante diferente do Dom Casmurro e, talvez por isso não tenha sido bem aquilo que eu esperava. Gostei do livro, acho que vale a pena lê-lo, mas também o achei por vezes aborrecido, sem que a vida do defunto Brás Cubas sofresse grandes desenvolvimentos. A verdade é que, no início, ou no fim, depende da perspectiva, achei que Brás Cubas iria ser uma personagem mais interessante. No início da narrativa pareceu-me que ele iria ser um bon-vivant do século XIX: rico, mulherengo e pouco preocupado com o que os outros pensam dele. Mas afinal Brás Cubas até era boa pessoa e de mulherengo tinha muito pouco, uma vez que, anda praticamente todo o livro com apenas uma mulher, Virgília, o seu único amor. Estava à espera de uma vida mais agitada e fechei o livro com a sensação de que a vida de Brás Cubas foi um bocadinho aborrecida e previsível...
A premissa é, no mínimo original, Brás Cubas decide escrever as suas memórias depois de morto, que a bem da verdade é quando elas fazem sentido e quando o autor terá mais tempo para se dedicar a esses afazeres. :) Brás Cubas foi, na infância, um pequeno terrorista que pregava partidas e fazia a vida dos criados e escravos num inferno. Protegido pelo pai que o adorava, foi crescendo no seio de uma família bem estruturada, feliz à sua maneira. Brás Cubas cresce, apaixona-se por uma espanhola que leva parte da fortuna do pai de Brás, parte para Portugal obrigado pelo pai, forma-se e regressa ao Brasil para estar junto da mãe que estava a morrer. Abalado com esta perda, parte para a Tijuca, para a propriedade da família, onde pretende restabelecer-se e pensar no que fará da sua vida no Brasil. Aí rouba o primeiro beijo da filha de uma das amigas da mãe, com quem não pensa casar, pois a rapariga é coxa, um defeito que não se coaduna nem com a beleza dela nem com o estatuto que Brás sonha para si: "Por que bonita, se coxa? por que coxa, se bonita?". A pedido do pai, regressa ao Rio, com o objectivo de ingressar na vida política e casar, pois político solteiro é algo que não cai bem na opinião da sociedade. A noiva que lhe está reservada é Virgília, uma rapariga de 16 anos, com quem Brás acaba por não casar, porque o pai desta decide patrocinar outro candidato a político, um mais bem preparado e posicionado, um que ambiciona tornar a sua filha Baronesa. Anos mais tarde, Virgília e Brás reencontram-se e o amor que não teve tempo de despertar no passado, arrebata-os desta vez. Tornam-se amantes e... é isto. O livro vai relatando a relação destes dois até ao dia, muitos anos depois, em que Brás Cubas está no seu leito às portas da morte.
Para além da história propriamente dita, está sempre presente uma crítica muito mordaz à sociedade carioca da época, o jogo das aparências e dos interesses, da importância que a opinião pública tinha na tomada de decisões relacionadas com a vida privada de cada um e de como o dinheiro compra quase tudo, inclusive a moral. Acredito que tenha sido uma pedrada no charco quando foi lançado. Tem passagens de humor deliciosas e que só por si valem a leitura do livro. :) Machado de Assis cria, na personagem de Quincas Borba, uma nova filosofia, o Humanitismo. Uma filosofia que professa a lei do mais forte, as guerras como selecção dos mais capacitados e afins. Alguns críticos indicam que esta terá sido a forma que Machado de Assis encontrou de ironizar a teoria da evolução de Darwin, contemporânea de Machado de Assis.
Está muitíssimo bem escrito, isso é inegável, foi a história central que achei fraca, com momentos em que senti vontade de saltar parágrafos. Recomendo porque é Machado de Assis e vale sempre a pena ler este autor, porque a escrita é do mais actual e divertido que existe.
Excerto:
" Não a vi partir; mas à hora marcada senti alguma cousa que não era dor nem prazer, uma cousa mista, alívio e saudade, tudo misturado, em iguais doses. Não se irrite o leitor com esta confissão. Eu bem sei que, para titilar-lhe os nervos da fantasia, devia padecer um grande desespero, derramar algumas lágrimas, e não almoçar. Seria romanesco; mas não seria biográfico. A realidade pura é que eu almocei, como nos demais dias, acudindo ao coração com as lembranças da minha aventura, e ao estômago com os acepipes de M. Prudhon..."
Boas leituras!
Fica aqui o trailer de uma das adaptações da obra para o cinema, Memórias Póstumas:
Gostei muito de sua resenha, por assim dizer, e concordo contigo: "A verdade é que, no início, ou no fim, depende da perspectiva, achei que Brás Cubas iria ser uma personagem mais interessante."
ResponderEliminarMesmo sendo de Machado de Assis acho que a história poderia ser trabalhada de modo diferente. Li também o livro veja aqui http://bit.ly/ewwlLY
É um de meus livros favoritos (já li duas vezes). A dedicatória do livro aos vermes (que virão lhe roer o corpo), feita pelo próprio personagem (através de Assis, claro) prenuncia que teremos pela frente um livro se não genial, delicioso. Não entendi algumas colocações suas e discordo do autor do comentário acima. Machado é gênio, um dos poucos que temos.
ResponderEliminarPerdão, a dedicatória correta é “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas Memórias Póstumas”.
ResponderEliminarJaquee Ribeiro: Achei mesmo que a vida de Brás Cubas iria ser mais interessante de seguir. Mas gostei do livro, só não tanto como estava à espera quando o decidi ler. :)
ResponderEliminarJair e.: Como já disse, no texto e na resposta anterior, não é que não tenha gostado do livro, só não gostei tanto como estava à espera. Impossível não gostar de Machado de Assis e dedicatória é realmente deliciosa. :)
Olá N. :)
ResponderEliminaracabei agora de ler esse livro que tinha descoberto no teu blogue.
Adorei.
beijinho
Manuel: É um livro bem divertido! E ainda bem que contribui, de certa forma, para que o lesses.
ResponderEliminarBom domingo! :)
Como não gostar de Machado de Assis? Um mestre literário, com sua escrita fria e sagaz, com sua ironia mordaz que avidamente busca dissecar o ser humano e expor sua imundice, e que consegue fazê-nos rir ainda por cima. Um escritor visionário e vanguardista, rompeu com a estética romântica no Brasil e instaurou o Realismo, a exemplo do famoso Eça, Machado tece críticas sociais e consegue atingir o mais fundo de nós mesmo. Nos contos, mais até do que nos romances, é que Machado mostra-nos seu absurdo conhecimento da alma humana, posso citar como referência o tão falado "A Cartomante", conto ótimo, deixo a deixa, N. Martins.
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